PRECONCEITO
Inserido em todas as sociedades e mais comum do que se imagina, o preconceito e todas as suas formas vive e é praticado com o objetivo precípuo de menosprezar o outro, constituindo um ato deplorável por essência. Definido como um conceito ligado à discriminação e às diferenças existentes no mundo, geralmente está associado a atribuições de valores em certos aspectos, como classe social, etnia, cultura, religião, preferência sexual, gênero sexual, entre outros; fazendo um rápido exercício de memória, podemos elencar alguns tipos mais comuns, como o preconceito associado às mulheres (machismo, misoginia ou sexismo), aos homens (misandria), aos judeus (antissemitismo), e ainda o preconceito social, preconceito cultural (etnocentrismo e xenofobia), preconceito linguístico, preconceito religioso, preconceito racial, e também os estereótipos e os estigmas, com status de conceito e responsáveis por diversos tipos de preconceito.
Preconceito e Discriminação
Apesar de haver semelhanças na forma de interpretar, preconceito e discriminação são termos diferentes. Enquanto o preconceito engloba qualquer atitude negativa a uma pessoa ou a um grupo social, derivando-se de ideias preconcebidas baseadas em opiniões superficiais, não adquiridas com a experiência, e sim em generalizações advindas de estereótipos, a discriminação é o tratamento injusto de pessoas pelo fato de pertencerem a um determinado grupo, e implica em separar, segregar, estabelecer diferenças.
Na década de 1950, o cientista social Oracy Nogueira escreveu o livro Preconceito de Marca. Realizando um estudo social com base nas relações raciais na cidade de Itapetininga – SP, Oracy identificou, através de seus estudos comparativos da situação racial brasileira com a norte-americana, a existência de dois padrões de discriminação: o preconceito de marca e o preconceito de origem, sendo o primeiro relativo à realidade brasileira e o segundo, à realidade americana.
Preconceito de marca – Relacionado às aparências, toma como referência para os atos discriminatórios: os traços físicos do indivíduo, a fisionomia (cor de pele, textura do cabelo, formato facial), gostos, variantes linguísticas e culturais;
Preconceito de origem – Discriminação relacionada à origem do indivíduo, onde este descende de grupo étnico considerado inferior. Exemplo disso, os indivíduos ligeiramente “brancos” nos EUA são considerados e tratados como negros. No Brasil, o mestiço que não apresenta traços negroides ou os têm pouco visíveis, são tratados como brancos ou não são considerados negros.
Racismo Estrutural
Racismo Estrutural. Conceito obtido através da ciência, pesquisa de fatos históricos, análise de questões sociais e resultado de profundas reflexões acerca de situações econômicas, políticas e jurídicas concomitantes, demonstrando que a estrutura racista predomina na sociedade brasileira.
No racismo estrutural, pessoas são tratadas de forma desigual pelo fato de que existe um preconceito que usa a raça como fundamento, justificado este comportamento por quem o pratica a fatores sociais ou históricos. Geralmente quem sofre discriminação por questão de raça é vítima de quem quer obter privilégios. A diferença de tratamento entre as pessoas é uma marca do racismo estrutural, sendo que raça é um termo em evolução, dinâmico, não definitivo, não estático, por muitos estudiosos substituído por etnia, fazendo com que o Racismo nada mais seja do que uma forma de segregar pessoas.
A desigualdade racial representa um revés nas políticas sociais, pois apresenta quadros de violência social ocorrida através de agressão física ou verbal, cultura de comportamento e segregação, ocasionando problemas de estrutura social, trazendo reflexos na economia, relações sociais, apresentação política e organização jurídica e originando problemas de patologia em função do individualismo que faz parte do racismo.
Questão étnica no Brasil: povos indígenas e afrodescendentes
Antes da chegada dos portugueses ao Brasil, já existia no país um mosaico étnico e cultural composto de diferentes povos indígenas. Após o início do processo de colonização no século XVI, estes povos foram sofrendo processo gradativo de extermínio e dominação, somando-se aos indígenas sobreviventes, milhões de africanos, trazidos à força para trabalharem como escravos, entre os séculos XVI a XIX. Em meados do século XIX e sobretudo após o processo de abolição da escravatura (1888), chegaram ao Brasil grupos de imigrantes europeus (italianos, espanhóis, alemães, poloneses, além dos portugueses) e asiáticos (árabes, japoneses, chineses), para trabalhar na lavoura do café e nas indústrias, fazendo do país uma formação étnica singular, com diferentes grupos étnicos convivendo, interagindo entre si, ocasionando um intenso processo de miscigenação, unidos pelo fator comum que é a língua, porém, em muitos casos, mantendo as suas tradições e costumes e contribuindo significativamente na formação da identidade cultural brasileira, na diversidade e pluralidade de sua população, na linguagem verbal (idioma) e nas formas de expressão, variedades linguísticas, sociais e culturais.
Povos Indígenas
Quando da chegada dos portugueses ao Brasil, segundo cálculos aproximados, aqui viviam cerca de 4 milhões de ameríndios, com seus costumes, crenças e organização social e de sobrevivência próprias. Após fracassada tentativa de escravizar estes povos – milhares resistiram ao trabalho imposto pelos portugueses – muitos indígenas foram exterminados em conflitos com fazendeiros, garimpeiros e outros grupos que invadiam suas terras, ou durante o processo de colonização, ou por doenças contraídas no contato com o colonizador, como a gripe, catapora e sarampo,
responsáveis por aniquilar comunidades indígenas inteiras; houve também a descaracterização de inúmeras culturas pelos processos de aculturação (entre eles, o catequismo).
Hoje, segundo dados do último censo, há a presença de 896,9 mil indígenas vivendo no Brasil, distribuídos em 305 etnias e que usam 274 línguas diferentes. Apesar desta enorme redução, a população indígena voltou a aumentar nas últimas décadas, devido às melhorias nas políticas de proteção, demarcação de terras indígenas e maior atenção a estes povos, constituindo um universo indígena no país bastante diverso, onde algumas nações mantém a sua identidade e tradições, mantendo laços estreitos com a sociedade, enquanto outras só falam português e adquiriram hábitos da civilização ocidental, como o consumo de produtos industrializados, e ainda há os povos que se mantém isolados, em áreas próximas à fronteira ou de difícil acesso, sem nenhum contato com as outras comunidades.
Afrodescendentes
Calcula-se que, entre 1500 até 1888 (período de escravidão), foram capturados e trazidos para o Brasil cerca de 5 milhões de africanos, originários principalmente dos
povos sudaneses (Iorubas, Jejes, Malês, Ibos, entre outros) e Bantos (Cabindas, Bengalas, Banquisas, Tongas) de Angola e Moçambique, com entrada no país principalmente pelos portos de Salvador, Recife e Rio de Janeiro, trazidos para trabalhar na lavoura de cana-de-açúcar, de algodão, de café, na mineração, nos serviços domésticos e de ofício (carpinteiros, pintores, pedreiros, ourives, etc.).
O Brasil foi o último país ocidental a abolir a escravidão, em 1888, porém sem criar políticas de inclusão, proteção e incentivo, relegando os ex-escravizados à própria sorte e, mesmo libertos, continuaram em situação desfavorável e à margem da sociedade, expostos ao preconceito, à discriminação e à segregação. Neste período, havia por parte do governo o estímulo à imigração, e os postos de trabalho disponíveis foram ocupados majoritariamente pelos europeus que, em sua maioria, já exerciam em seus países de origem atividades ligadas à lavoura, ao comércio e à indústria. O Brasil é hoje o país que abriga a maior população negra fora da África, contudo os afrodescendentes ainda enfrentam inúmeras dificuldades, consequência do legado histórico e de uma dívida histórica do país para com estes povos, das desigualdades sociais e do preconceito. A situação da desigualdade social entre brancos e afrodescendentes se dá, além da raiz histórica marcada por quatro séculos de escravidão, também por uma educação pública deficitária, da necessidade que faz os jovens trabalharem para complementar a renda familiar, da falta de informações (apesar de toda a tecnologia atual) e do preconceito. Desta maneira é negado aos afrodescendentes – e também aos indígenas – o direito às igualdades de oportunidades.
Racismo é crime segundo a Constituição Federal brasileira, punível com regime de privação de liberdade e multa; porém é difícil provar o crime, sendo necessário registro de ocorrência policial e testemunho de uma terceira pessoa, ao passo que muitas vezes este crime é enquadrado como outro artigo de menor poder ofensivo e pena mais branda. Muitas vezes, porém, o racismo não se mostra de forma aparente – como comprovar que um emprego foi negado a uma pessoa devido a sua cor de pele é um exemplo.
Cotas e Políticas Afirmativas
Políticas Afirmativas
Ações Afirmativas são as políticas que tem como objetivo combater e acabar com a exclusão social, cultural e econômica de indivíduos que pertencem a grupos que sofrem qualquer tipo de discriminação, através do fornecimento de recursos e outros benefícios que tenham por meta interromper processos históricos de discriminação (raciais, étnicas, religiosas, de gênero, etc.), estimulando o ingresso na participação política de grupos sociais considerados minorias (mulheres, homossexuais, indígenas, negros, entre outros), conseguindo assim melhor acesso a serviços básicos da cidadania, tais como saúde, educação, moradia, cultura, emprego, configurando assim o principal objetivo das ações afirmativas, que é o combate às desigualdades, ofertando a oportunidade de alcançar posições importantes na sociedade a indivíduos que, de outra maneira, estariam ainda excluídos. Mesmo sendo geralmente temporárias, pode-se afirmar que as ações afirmativas transformam o perfil demográfico da sociedade.
Originados por iniciativa do setor governamental ou a partir do setor privado e da sociedade civil, as ações afirmativas incluem medidas que abrangem desde o estabelecimento da igualdade de direitos e cidadania até a valorização e resgate simbólico de culturas, raças e etnias, ocorrendo na forma de estímulo na contratação profissional de pessoas e de grupos discriminados no âmbito de trabalho e escolar, também no estabelecimento de cotas e outras formas de estímulo a indivíduos ou grupos vítimas de discriminação (bolsas, auxílios e empréstimos de recursos financeiros; redistribuição de terras e casas; proteção governamental a estilos e modos de vida ameaçados de extinção).
Há diferenças entre uma ação afirmativa, que se configura com um caráter preventivo à discriminação ou amenizando seus efeitos, e a ação política antidiscriminatória, que se apresenta geralmente sob duas formas: uma, age através da repressão aos que discriminam, enquanto a outra visa somente conscientizar a população dos efeitos nocivos da discriminação. Ele acaba por repetir as distinções por raça no país.
Cota
No Brasil, no início do século XXI, passou a vigorar em algumas universidades públicas o sistema de cotas (que são ações afirmativas), com o objetivo de corrigir injustiças históricas causadas pela escravidão. A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) foi a primeira universidade do país a adotar o sistema de cotas para o ingresso de estudantes. Um dos pontos mais polêmicos deste sistema é que raça, no Brasil, é um conceito auto declarável, ou seja, cada um pode decidir a própria raça, apoiados em critérios subjetivos. Segundo a Uerj, são casos pontuais, que não invalidam o sucesso do sistema, apresentando exemplos de mobilidade social, onde indivíduos que, de outra forma, não conseguiriam as mesmas condições de ingressar em uma universidade pública, melhorando assim suas condições de trabalho e de vida.
As críticas a este sistema de cotas segue a argumentação de que ele acaba por repetir as distinções por raça no país, aumentando a segregação e o racismo, provocando efeito contrário no combate aos preconceitos, em que as cotas resultariam em mais problemas sociais causados por diferenças de cor, raça e etnia. Além disso, há também a argumentação de que o sistema não é meritocrático por não sujeitar o sucesso individual ao mérito próprio de cada um. Quanto a isso, em 2012, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Antônio Mello, proferiu voto favorável ao sistema de cotas raciais nas universidades públicas brasileiras, afirmando que o sistema de cotas deveria ser extinto somente quando diminuíssem substancialmente as desigualdades sociais no Brasil, fazendo das cotas, portanto, uma medida temporária.
Sandro Ferreira Gomes, Professor de Língua Portuguesa, Conselheiro Municipal de Políticas Culturais em Gravataí/RS, Servidor Público, Porto Alegrense, admirador das belas artes, do texto bem escrito e das variedades de pensamento.
03 ANOS DE COLETIVEARTS
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2 Comentários
Ótima pesquisa sobre preconceito.
ResponderExcluirObrigado, Laís. Foi um trabalho de pesquisa extenso, através de diversas fontes de pesquisa, como a revista Fronteiras do Pensamento. Adoro teses, aprendi muito pesquisando e escrevendo esta.
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