BRETT: COMEÇANDO A CAVALGAR
Os fãs de quadrinhos, em especial quadrinhos de faroeste, ganham um importante reforço. A Editora Saicã , que é responsável pela publicação do personagem Adam Wild da Sergio Bonelli Editore no Brasil, prepara o lançamento no Catarse da HQ de faroeste Brett, quadrinho totalmente produzido no Brasil.
Brett foi idealizado e criado por Rodinério da Rosa em 1994, e Moacir Martins foi contratado para ilustrar a primeira edição. Mas devido as dificuldades de publicação na época, Rodinério deixou o personagem na geladeira, e só este ano saiu da gaveta com a descoberta do projeto pelo diretor e produtor da editora Saicã, Neimar Nunes, que incentivou Rodinério a editar a revista pelo selo de sua editora.
O roteiro e os desenhos seguem a linha bonelliana de Tex, mas vão além, com personagens mais violentos e cenas mais fortes. A revista, com 64 páginas, será no formato 16x23 cm, com capa dura em cores e laminação fosca, e o miolo em preto e branco em papel requintado. A capa conta com Ronald Guimarães, fera da ilustração, já conhecido no universo bonelliano.
A primeira edição, "Massacre em Utah", trata sobre a rota do Oregon, por onde centenas de caravanas passavam para chegar no Oeste. John Finn, amigo de Brett, guia uma caravana que encontra dificuldades para continuar devido ao ataque de bandoleiros. John busca ajuda do amigo Brett e Chako Álvarez. O roteiro não deixa de falar sobre a ganância do homem branco e sua ambição sobre as terras dos índios, bem como a violência contra a mulher em uma época que elas não tinham qualquer tipo de voz contra o machismo patriarcal. Pura ação do começo ao fim, esta é a primeira HQ de uma série de 6 números. A principio será trimestral. A primeira HQ é escrita por Rodinério e desenhada por Moacir e Vinicius da Silva, em 1994.
Os responsáveis por Brett.
Rodinério da Rosa, nasceu em Santa Maria, RS, escreve quadrinhos desde criança, e chegou a desenhar entre os 12 a 30 anos. Depois assumiu somente escrever. Junto aos amigos Law Tissot, da famosa e consagrada série Cidade Ciber, e Marco Muller, criaram Mutação, o primeiro fanzine de quadrinhos, da cidade de Rio Grande, no Rio Grande dos Sul, quando Rodinério residiu nesta cidade dos 12 aos 20 anos, quando migrou para Porto Alegre. Em Porto Alegre, publicou e editou a revista Made in Brasil Quadrinhos, que contou com nomes de peso da nona arte, como Julio Shimamoto (mentor de Rodinério no mundo da nona arte), Elmano Silva, Law Tissot, Edgar Vasques, Santiago, entre outros.
Na Made in Brasil, numero 1, contou com o talento do jovem desenhista Rodrigo Rosa, hoje consagrado editor da Editora Figura. Também foi editor da revistinha de humor Talebang, lançada pela Editora Escala, com cartunistas de todo o Brasil. Vice Presidente da GRAFAR (artistas gráficos associados do RS), e nas horas vagas, auxilia na causa da Proteção Animal em Cachoeirinha- RS, cidade metropolitana de Porto Alegre, onde reside atualmente.
Moacir Martins: Artista gráfico, nasceu em Triunfo e hoje mora em Porto Alegre. Colaborador em várias publicações da imprensa sindical gaúcha como: Versão dos jornalistas (Sindicato dos Jornalistas), Vox Médica (Simers - Sindicato médico do Rio Grande do Sul). Colaborou como Ilustrador na série televisiva O Continente de São Pedro (RBS TV/ GLOBO), e na revista "SuperInteressante – Aventuras na História”. Roteirista e desenhista na revista Picabu. Co-criador e editor, com Carlos Ferreira, do Projeto Esqueleto de Revistas em quadrinhos.
Vinícius da Silva: nasceu em Porto Alegre/RS em 1971. Na adolescência iniciou parceria com o desenhista Moacir Martins, quando escreveram e desenharam diversas HQs. A maioria nunca chegou a ser publicada. Publicou aos 17 anos a HQ Feliz Aniversário, no Fanzine Fantoche, que durou somente duas edições. Vinícius e Moacir foram selecionados em três salões de imprensa com as HQs Pé de unha, Luz e Sombra e Quem Ri Por Último. Depois disso, Vinícius enveredou pela música e largou os quadrinhos por algum tempo. Voltou a desenhar em 2004 a HQ Demônios na Cozinha, e produziu trilha sonora para a história. Após alguns anos, voltou a produzir e publicar a webcomics VISONHOS.
Para apoiar Brett no Catarse:
O ARTE E CULTURA apoia o lançamento de Brett, e aproveitando a matéria sobre esse grande projeto foi conversar com Rodinério da Rosa, conhecer um poucos mais obre ele. O cara é fantástico, confiram abaixo.
RODINÉRIO DA ROSA
JORGINHO: Quem é Rodinério da Rosa, como você se define?
RODINÉRIO DA ROSA: Um inquieto amante das artes, da cultura.
JORGINHO: Como os quadrinhos entraram em sua vida?
RODINÉRIO DA ROSA: Meu pai era leitor de livros de bolso, e também lia quadrinhos, mas em menor quantidade que livros de bolso. E eu lia as coleções dele da Monterrey, Cedibra. Recordo do primeiro gibi que ganhei dele, creio que eu tinha cerca de 6 anos: Gato Félix.
Meu pai nunca foi conservador a ponto de proibir leitura de quadrinhos, e na verdade isso ajudou muito para que eu fosse em pouco tempo, também, voraz leitor de literatura. A biblioteca do Cassino em Rio Grande, onde é hoje o Arte Estação que promove a cultura na região, foi a primeira onde eu pegava livros. Residi em Rio Grande dos 12 aos 20 anos.
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Rodinério com o mestre Moebius |
JORGINHO: Você desenhou durante muito tempo, por que parou?
RODINÉRIO DA ROSA: Desenhei até 2004, quando resolvi focar em escrever, principalmente para o audiovisual. E ao mesmo tempo trabalhava com direção de cena, e direção de fotografia. O cinema é a segunda paixão, depois dos quadrinhos. Na verdade, o cinema eu vejo como frames de quadrinhos em movimento.
Entre os trabalhos que desenvolvi nesse meio tempo, houve um que foi um episódio para o extinto Histórias Extraordinárias da RBS TV, repetidora da TV Globo no RS, chamado a Lista. Um docudrama da época pré revolução Farroupilha.
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Rodinério com o mestre Will Eisner, ao fundo com pastinha verde Moacir Martins |
JORGINHO: Como foi a experiência na criação do fanzine Mutação ?
RODINÉRIO DA ROSA: Quando residia em Rio Grande, enviava material para todas as editoras de SP e RJ (risos), e uma delas publicou um desenho que fiz na seção dos leitores, junto com meu endereço. Acho que a Calafrio. Não recordo mais. E o Law Tissot, viu meu desenho nessa revista, e buscou me contatar. Eu residia em uma rodovia na época, cuja numeração das casas era bem complexa. Ele foi até lá de carro com o pai dele, ou mãe, na época, não recordo mais, tentar localizar onde eu morava. E óbvio, não acharam. Ele enviou uma carta, e aí começaram nossas reuniões em torno de trocar HQs, informações e desenhar na sala da casa da Soninha, mãe do Law, e da falecida avó dele. Recordo do incentivo da Sonia para a nossa tentativa de sermos artistas. Éramos agraciados com mimos, como suco natural de uva, bolachinhas e sanduíches. E desenhávamos por horas. A Ana Clara, irmãzinha do Law, ficava em volta observando. Hoje é uma artista conceituada, assim como o Law.
O Law apresentou outro vizinho, o Marco Muller, que também desenhava e queria criar um fanzine. Dessas reuniões surgiu o Mutação. Trabalhei somente na primeira edição, e como trabalhava de paginador no jornal local, eu sabia como montar a edição para xerocar e casar as páginas. No ano seguinte, eu estava mudando para Porto Alegre, porque queria explorar novos horizontes. Em novembro de 1984, saiu a primeira edição do Mutação. Nessa época eu já mantinha correspondência com o Mestre Shimamoto, que foi meu mentor no mundo da Nona Arte.
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Presente que Rodinério ganhou do mestre Shimamoto |
Nesse tempo, antes de mudar para Porto Alegre, eu tinha visitado a extinta Grafipar duas vezes, onde conheci Gustavo Machado, Watson Portela, Itamar, Franco de Rosa entre outros. Foi um enorme aprendizado. E o Gustavo nos presenteou com a capa do n°1 do Mutação.
JORGINHO: Poderia falar um pouco sobre seu trabalho à frente das publicações Talebang e Made in Brasil Quadrinhos?
RODINÉRIO DA ROSA: Quando cheguei em Porto Alegre, fui visitar o já falecido Jorge Barwinkel, com quem mantinha correspondência através dos fanzines, assim como o Oscar Kern da Historieta. Jorge me apresentou ao Canini e ao João Mottini. E eu frequentava a livraria Coletânea nos altos do Mercado Público, onde tinha encontros de colecionadores e desenhistas, em que conheci Jerri Dias, e depois Drégus de Oliveira, com quem vim a fazer a Made in Brasil.
Mas antes da Made, participei das reuniões no Diário, onde conheci Vasquez, Eugênio Neves, Santiago, Uberti, Celso Schröder, Iotti, entre outros. A partir dessas reuniões fundamos a GRAFAR. Era um momento de efervescência cultural. A turma mais jovem se reunia separada também, para criar grupos de leitura e escrita, desenhos. E nessas reuniões na casa dos pais do Drégus, Dirceu e Monalisa, a quem devemos muito apoio por cederem o espaço para nossos mirabolantes projetos juvenis, nasceu a Made in Brasil. Durou 4 edições, com intervalo de anos entre a 1 e 2, e depois a 3 e a 4, que saíram com dois anos de diferença entre uma e outra. O primeiro número, tirando a capa, foi bem amador. Na edição 2, Edgar Vasquez ficou surpreso com minha iniciativa de ter produzido a revista em offset (era o pulo dos fanzines para as edições independentes impressas em offset), foi gentil e se ofereceu para fazer a capa do número 2, que hoje é a edição mais rara da MIB. Não encontrei nem garimpando na web. E também contei com o apoio do velho Mestre Shima, no número 3 e depois no número 4. O número 4 teve patrocínio da Corsan e foi quando a MIB atingiu a maturidade profissional. Mas não houve como prosseguir em função da falta de grana para as edições seguintes.
Enviei o projeto da Talebang, que foi aceito e saiu pela Editora Escala para todo o Brasil. Mas recordo que eles não tinham verba para isso, e foi oferecido cerca de R$ 50,00 por desenhista, em valores de hoje. Conseguimos lançar o nome da GRAFAR na capa e ajudar a divulgar um pouco mais a associação. Foi através da GRAFAR que esbocei, com o incentivo dos amigos e colegas, meus primeiros desenhos de cartum. E um deles, que fiz para a exposição do Fórum Social Mundial em 2004, foi impresso pela Human Rights da Suiça, em cartilha que eles publicavam. Eles mandaram e-mail pedindo autorização, mas ignorei achando que era trote (risos). O Augusto Bier, que recebeu contato deles, um mês depois falou que eles haviam enviado e-mail pedindo meu contato para autorizar a publicação do Cartum. Depois de conhecer Moebius, o mestre Shima, passar para Will Einser uma MIB, na Bienal de 91 no RJ, esta foi uma das minhas maiores alegrias na área artística.
JORGINHO: Como você enxerga o cenário político e cultural no Brasil neste momento?
RODINÉRIO DA ROSA: Não enxergo nada na atualidade política e cultural, porque estamos em um desgoverno cuja meta é o Ensaio da Cegueira, do Saramago. No pior dos sentidos.
Mulher Boa, hq de Rodinério publicada na revista Made in Brasil:
JORGINHO: Vamos falar de Brett, como surgiu o personagem?
RODINÉRIO DA ROSA: Eu lia Tex desde os 14 anos. Mas assim que surgiu Ken Parker, fiquei mais fã deste último, mas sem deixar Tex de lado, porque remetia ao oeste romantizado, que conhecemos dos filmes antigos hollywoodianos. E também porque aprendi a admirar as artes de Gallepini, Ticci, Fusco, Erio Nicolò. Percebi que durante as crises editoriais só Mônica e Tex não paravam.
Em 1994, eu tinha um Estúdio de criação gráfica, administrado pela minha ex esposa, junto a minha ex sogra, que estava indo muito bem. Então pensei em criar um personagem na linha Tex, fazendo uma coisa que gosto, e também entrar no mercado editorial. Isso porque também Chet e Chacal vendiam bem. Vendiam mais que Ken Parker. Sinal que o Velho Oeste romantizado tem um público fiel. A ideia era produzir 4 edições, para só então lançar a primeira.
Claudio Marzo foi o primeiro desenhista a dar uma cara para o personagem, mas desenhar 60 páginas ainda não estava nos planos dele. Até porque eu não poderia pagar muito, era cerca de R$ 30,00 por página em termos de hoje. Mas nas reuniões da GRAFAR, conheci dois jovens desenhistas, o Moacir Martins e o Vinícius da Silva. Moacir topou a loucura de desenhar o Brett. Mas logo percebeu que sozinho seria impossível, e tendo que desenvolver outros trabalhos, porque o Brett não pagava o suficiente para que se dedicasse só a isso, ele chamou Vinícius para trabalharem juntos.
Nisso foi quase um ano, e o estúdio que não teve verbas para acompanhar as mudanças tecnológicas, fechou. E com ele o sonho de publicar uma paixão, um personagem do Velho Oeste.
Em outubro de 2021, revendo e arrumando pastas de materiais antigos, topei com as páginas já amareladas do Brett. E deu um estalo: por que não colocar no Catarse? Conversando com Moacir, divulguei na Internet. No mesmo dia, recebo uma mensagem do Neimar da Saicã, com proposta para lançar o Brett pelo seu selo. Chegamos a um acordo. A Saicã publica Adam Wilde da Bonelli e tem um ótimo respaldo entre seus leitores. Parceria firmada.
JORGINHO: Quais as suas maiores influências na criação dos roteiros do personagem?
RODINÉRIO DA ROSA: A influência do número 1 foi Gianluigi Bonelli. Eu entreguei ao Moacir 60 páginas com rabiscos tipo storyboard, como o criador do Tex fazia. Em um Tex, acho que da década de 1980, publicaram um modelo dos roteiros dele. E achei excelente.
O número 2 estou escrevendo conforme faço os roteiros para TV, Web e cinema, em software de formatação estilo Master Scenes. Assim deixo o desenhista livre para criar, o que não ocorre se eu enviar o texto com storyboard.
Eu gosto de pensar do zero. Mas óbvio que esse zero sempre vem de livros e HQs que já li, filmes que assisti, memórias que ficam em sua mente, e despertam quando você começa a escrever.
Mas sempre que penso na história do Oeste norte americano, vem o livro do Dee Brown em mente: "Enterrem meu coração na curva do rio." Chocante sempre que releio. E sempre fico muito mal depois da leitura. Pretendo fazer uma saga mais tarde com 3 edições, contando a história do massacre dos Sioux, claro, com a licença poética de Brett na história.
Mas voltando à pergunta: Milazzo é minha maior influência, seguido dos Tex de Antonio Segura, e dos textos romanceados de Gianluigi Bonelli. Acredito que essas influências criaram um Brett que fica no meio termo de um Tex e Ken Parker. Mas isso o leitor dirá. Pois eu posso ver de uma maneira, e o leitor, de outra.
JORGINHO: Estás lançando a primeira edição do personagem, mas a curiosidade é grande, planeja uma série longa ou limitada de Brett?
RODINÉRIO DA ROSA: Já entreguei na pergunta acima. Mas as 3 que citei provavelmente serão edições especiais, ou não. Ainda é planejamento. Mas acertamos com Neimar da Saicã, nessa primeira leva, 6 edições trimestrais. Se Brett for bem, vai avante e à galope.
JORGINHO: Para terminar, deixe uma mensagem para o leitor do Arte e Cultura
RODINÉRIO DA ROSA: Contamos com vocês para apoiar essa iniciativa dos autores nacionais, e ajudar a manter os artistas brasileiros publicando.
Rodinério Rosa
Moacir Martins
Vinícius da Silva
Editora Saicã
Para apoiar Brett no Catarse:
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"...Recordo do primeiro gibi que ganhei dele, creio que eu tinha cerca de 6 anos: Gato Félix. Meu pai nunca foi conservador a ponto de proibir leitura de quadrinhos, e na verdade isso ajudou muito para que eu fosse em pouco tempo, também, voraz leitor de literatura." - Rodinério Rosa |
Jorginho é Pedagogo, Filósofo, ilustrador com trabalhos publicados no Brasil e exterior, é agitador cultural, um dos membros fundadores do ColetiveArts, editor do site Coletive em Movimento, produtor do podcast Coletive Som - A voz da arte, já foi curador de exposições físicas e virtuais, organizou eventos geeks/nerds, é apaixonado por quadrinhos, literatura, rock n' rool e cinema.
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3 Comentários
Baita matéria Jorginho. Entrevista massa. Não conhecia o Rodinério. Vi o projeto do Brett na Internet. Me chamou atenção. Sabes que adoro faroeste. Parabéns por esse resgate.
ResponderExcluirObrigado Paulo Ricardo.
ExcluirÉ um enorme elogio vindo de um ganhador do prêmio Ângelo Agostini. Obrigado Paulo.
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