CONTRAPONTO

 

O Circo 

Estava conversando com um amigo sobre os aplicativos de relacionamentos e as nossas experiências muito doidas por lá. Adoro trocar histórias assim e rir muito de mim mesma e das loucuras que me surgem! Resolvi falar sobre isso por aqui então. Sempre estive por dentro das redes sociais, aplicativos e programas, portanto não é de se estranhar que eu conheça vários. Tinha (não sei se ainda existe) até um app de relacionamentos apenas para nerds! Legal, né?


Um dos que mais usei foi o Happn, para quem não o conhece, é um aplicativo de relacionamento o qual você cria um perfil e pode dar match com pessoas que cruzam o seu caminho e também estão na rede. Uma proposta muito legal, se não fosse um pequeno e importante probleminha: os seres humanos do outro lado.


Para começar, quase todos os perfis que surgem colocam “#ele não” na descrição e muitos se limitam apenas a isso. Inclusive, é tanta gente que se diz contra o “Maldonaro” (aqui eu classifico ele como personagem de novela mexicana), que, sinceramente, nem sei como ele foi eleito! Alguns, de vocabulário mais ampliado, colocam: “Odonto. #Ele não”, “Pai de pet. #Ele não”. Informações completíssimas, as quais você pode ter uma profunda noção do sujeito! Claro que não tem como se aprofundar na descrição de personalidade de ninguém com 500 caracteres, mas dá para escrever algo mais decente que isso, vamos combinar!


A maioria é tão rica, que não sei como não conseguiu um casamento no extrangeiro ainda. Muitas fotos em Dubai, no Havaí, nos EUA, na França… Fotos em praias paradisíacas, hotéis de luxo e sempre aparece um carro de modelo caro ou uma moto que vale um apartamento. Muitas das fotos nem dá para ver muito da “lapa” do sujeito, mas podemos ver que viaja (bastante na maionese). Ainda estou tentando achar uma explicação positiva para a galera encher de fotos assim.


Dar match não é difícil, na verdade, sua página enche de combinações, mas a maioria esmagadora não fala. Pode-se até desconfiar que a plataforma cria perfis fakes apenas para segurar o pessoal. E não sou eu apenas reclamando disso, já li várias pessoas reclamando de gente que não fala.


Muitas vezes em que puxei assunto, foram difíceis de continuar, os caras apenas se limitavam a responder o que eu perguntava e eu - como diz Fernando Anitelli - “sou facinha de marré deci, se a maré subir, vou me levantar”. Se não flui o assunto, bloqueio e excluo na hora. Muitos homens querendo um encontro para aquele mesmo dia, às 22h da noite e nem vou comentar aqui das besteiras relacionadas a nudes. Poucos realmente falam de forma decente e dentre esses poucos, ainda temos de selecionar alguém que realmente nos agrade. Fácil, né?


O que mais me cansa são aquelas mesmas falas de sempre “seja criativo, não venha com ‘oi, tudo bem?’”. Como assim? Eu me sinto sobrecarregada com essa baita cobrança de ser criativa nas minhas primeiras palavras. Tá mais fácil prestar concurso! Até me experimentei brincar disso, mas as pessoas do outro lado nunca faziam por merecer. E eu não sou trapezista de circo para ficar fazendo malabarismo para agradar ninguém!


Teve um app que eu me interessei mais, porque somente nós mulheres podemos iniciar a conversa. Portanto, os homens têm de se esforçar um pouquinho mais nas descrições de perfis, fotos e etc para que nos chamem a atenção e mereçam a palavra. Inclusive, sinto falta disso, homens que se esforçam! Como eu já disse uma vez aqui, muitos não se esforçam nem com a própria aparência. Depois jogam o charminho de “sou feio e ninguém se interessa por mim…” para atrair as mulheres “mães de namorados” que os adotam e ainda se sentem privilegiadas por isso. Mas, esse aplicativo (por que será, né?) tem pouquíssimos homens. Logo acaba os da tua proximidade e o programa apresenta gente de 50 km, 90 km e por aí cresce…


Ainda lembro da minha adolescência e os chats do Terra. Ninguém vinha com cobranças em perfis, pedindo para ser criativo ou perguntando qual o seu partido político. As pessoas se entregavam à conversa, era tudo mais leve, engraçado e sempre surgia amizades legais. Qual a diferença daquela época para a atual? É que a maioria das pessoas não está disponível para se envolver com ninguém de verdade. Provavelmente muitos baixam um desses aplicativos porque enjoaram do “My Talking Tom” e da “Fazendinha”. Inclusive, a maioria coloca que não sabe o que procura lá “baixei por engano!”. Esses aplicativos não são o retrato da sociedade atual para os relacionamentos, porque a maioria que está lá são pessoas realmente frustradas com suas vidas amorosas e com grandes dificuldades de se envolver. Um verdadeiro show de horrores. Mas ainda tem pessoas com as quais podemos nos envolver na vida real e essa é a boa notícia. O mundo físico nunca esteve tão convidativo quanto agora. Precisamos olhar mais nos olhos uns dos outros, rir, conversar com estranhos e colocar essa vida que já estava de quarentena bem antes de 2020 a funcionar! Chega de circo de horrores, “bora” para vida!



Miriam Coelho

Miriam Coelho é artista das imagens e das palavras.

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2 Comentários

  1. Achei ótimo o texto, é terrível o quanto as pessoas têm medo de terem conversas criativas, principalmente nesse tipo de app. Cansa sempre as mesmas conversas monossilabas, para que criam um perfil? Para responder sim ou não apenas? Para conhecer as pessoas tem que se desenvolver uma biografia, falar mais do que sim ou não.

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    1. Simmmmm! Super concordo! Temos de ser criativos? Sim! Mas ambos! Pow! Ninguém é trapezista de circo ou palhaço para ficar agradando meros expectadores.

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