NAVALHAS AO VENTO

 

MARIAS BRUACAS EXISTEM

Não tenho o hábito de ver novelas, aliás nem tenho tempo para isso. De tanto ouvir os comentários passei a acompanhar na mídia e nas rodas de salão de beleza o novo assunto da telinha do plin-plin, a reação da Maria Bruaca, personagem da novela Pantanal.

Na trama a personagem Tenório trata a esposa de forma desrespeitosa, dando-lhe, inclusive, a alcunha pejorativa de Maria Bruaca, termo regional brasileiro, usado para caracterizar mulher feia, grosseira, ignorante. Maria é constantemente ofendida, humilhada, magoada, pelas atitudes misóginas do marido que, inclusive, tem outra família. Ela não passa de uma empregada não remunerada dentro de sua própria casa e acredita que assim é um casamento. Nunca se rebelou, nunca questionou, ouve ofensas e serve ao marido na mesa e na cama… “Marias bruacas” sempre existiram na vida real e sofreram ou sofrem o mesmo drama televisivo.

Essa rotina de abusos emocionais é muito mais comum do que pensamos, até a hora em que a mulher acorda. E é nessa hora que a mulher passa a ser julgada por todos como uma pessoa que não dá valor ao marido que tem, afinal, ele é provedor da família, aquele que sempre deu o sangue para dar tudo para ela, que nunca deixou faltar comida nem uma boa casa, que exigia apenas a roupa lavada e a casa limpa… Muitas vezes as ofensas chegam como forma de brincadeira, até como demonstração de ciúmes… Mas o que muita gente não percebe é que nem só de casa e comida vive a mulher, que esse “Tenório” não nota o mulherão que tem, desdenha da sua inteligência, não aceita que ela se arrume ou use maquiagem, muito menos que trabalhe fora e a proíbe de interagir com pessoas, principalmente com o sexo masculino, sempre a acusa de estar se oferecendo para os outros, mesmo que seja um inocente “bom dia” ao vizinho. No sexo a mulher se sente como uma latrina onde o homem joga suas necessidades fisiológicas e nem ao menos dá descarga... e isso cansa.

Na vida de toda “bruaca” sempre tem um “Levi e um Alcides” que enxerga a mulher e toda a sua beleza. Levi dá valor aos pequenos detalhes, oferece carinho e atenção e se torna o espelho que a “bruaca” necessitava. Ela se vê como realmente é nos olhos do moçoilo que geralmente é mais jovem e mais atraente que o ignorantão. E aos poucos ela começa a se olhar, a se compreender. Não mais aceita ser chamada de “bruaca” e se reconhece como dona da casa, não mais como serviçal. Agora sabe o sabor do sexo e se nega a ser “usada” pelo marido, prefere ser amada pelo amante. Logo essa mulher descobre seu potencial, cria asas e percebe que não precisa de ninguém a não ser de si mesma e vai viver sua vida, geralmente longe do troglodita e do garanhão, afinal Levi foi uma tábua de salvação e não um amor para toda a vida. Para ela existe apenas um amor, o próprio, resultado de uma vida de sofrimento. E logo virá Alcides para colher a liberdade que Levi proporcionou. Ela não precisa de nenhum dos dois, descobriu-se, mas se resolver ficar ao lado do moço será por amor, não por necessidade e ele terá que ser muito foda para tê-la ao seu lado. Agora ela não aceitará qualquer coisa. Nada menos do que excelente.

E o final da história não tem muita variação: será divórcio ou assassinato. Afinal todo “Tenório” é um corno metido a valentão. A maior raiva nem é ser trocado, é perder a empregada e descobrir que sempre foi uma bosta na cama.


Isab-El Cristina Soares

Isab-El Cristina Soares é poeta, membro do Clube Literário de Gravataí, autora de 6 livros.  Graduada em Letras/ Literaturas, pós-graduada em Libras.


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