ARTE E CULTURA

 

5 Casas: longa documental introspectivo e inquieto estreia nos cinemas neste dia 8 de setembro


Grande vencedor do 35° Cine Ceará, filme também conquistou quatro prêmios na mostra gaúcha do 50° Festival de Cinema de Gramado, incluindo melhor filme


Em uma cidadezinha no interior do Rio Grande do Sul há cinco casas e cinco histórias que se confundem em uma mesma. Uma velha professora lutando para manter sua casa de pé, um jovem que sofre agressões por se recusar a esconder sua natureza, uma freira sendo transferida da escola que regeu com punho de ferro por décadas, um velho capataz em uma fazenda mal assombrada e um menino cujos pais morreram 20 anos atrás e que é hoje o diretor que volta para buscar as memórias de sua infância perdida e dar voz a essas pessoas. Histórias distintas, mas que juntas pintam um retrato pungente de um Brasil marcado por apagamentos e desigualdade.

Histórias distintas, mas que juntas pintam um retrato pungente de um Brasil marcado por apagamentos e desigualdade.

O documentário "5 Casas" chega às salas de cinema do Brasil a partir do dia 8 de setembro. Em seu longa de estreia, o diretor e artista visual gaúcho Bruno Gularte Barreto faz uma viagem ao seu passado no interior do Rio Grande do Sul. O caminho trilhado pelo realizador encontra as histórias de vida dos habitantes das cinco casas do título, com a sua própria como fio condutor. O trabalho também deu origem a um livro e uma exposição de arte de mesmo nome lançados em 2021.


"Quando eu fui embora da cidadezinha de Dom Pedrito, eu estava cheio de dor", relembra o diretor, que também é o narrador do filme. "As memórias da cidade estavam contaminadas não apenas pelo luto, mas também por que eu - assim como as pessoas nas cinco casas - sempre me senti um 'outsider' na sua sociedade conservadora", pontua. Bruno perdeu a mãe aos oito anos, vítima do câncer que assola a região onde nasceu, causado pelo uso desenfreado de agrotóxicos nas plantações próximas. Cinco anos depois, a mesma doença levou seu pai. Logo após, ele e seus irmãos deixaram a cidade.

Sem olhar para trás, Bruno deixou guardadas caixas de papelão com lembranças familiares em um galpão situado na fazenda do avô. Vinte anos depois, uma tempestade que arrancou parte do telhado do local o fez voltar à sua cidade natal. O documentário registra a redescoberta deste material. E o filme vai além da memória afetiva evocada por objetos, livros e fotos de família. A narrativa vai também ao encontro de pessoas que marcaram a infância do cineasta e de suas atuais realidades, trazendo à tona questões urgentes e emblemáticas do Brasil contemporâneo, como o etarismo, a especulação imobiliária, a homofobia e o conservadorismo.

O diretor interage com quatro personagens distintos, começando por uma velha professora de francês que toca um piano desafinado em uma pequena casa cercada de árvores. Ela luta para manter sua casa contra as construtoras que querem demoli-la para a construção de um prédio. Um homem vive há mais de 40 anos em uma fazenda isolada, que dizem ser mal assombrada. Um grupo de freiras conduz rigidamente uma escola, em especial uma delas, cuja transferência para outra localidade causa revolta na cidade. E um jovem gay sofre bullying e agressões por não conseguir esconder sua natureza, revidando e afirmando sua existência contra tudo e todos.

"As memórias deles são parte da minha história, e registrar as nossas conversas é uma forma de lhes dar voz", afirma Bruno. "Não é apenas uma forma de contar a minha história, mas sim  a de contar a nossa história através da voz deles", conclui. 5 Casas teve sua première mundial no maior festival de documentários do mundo, o Festival Internacional de Documentários de Amsterdã (IDFA), passando por vários festivais como o Biografilm (Itália), o Queer Lisboa (Portugal), o Cinélatino (França), e o Festival de Viña del Mar (Chile), onde recebeu o prêmio de melhor longa documental.

No 50° Festival de Cinema de Gramado recebeu os prêmios de melhor filme, direção, prêmio do júri popular e montagem na Mostra Gaúcha. No Cine Ceará, um dos mais importantes festivais do Brasil, levou o grande prêmio de melhor filme, além de roteiro e som. Também foi premiado no Panorama Coisa de Cinema e no Atlantidoc (Uruguai). "5 Casas" é uma produção da Vulcana Cinema, com coprodução da TAG/TRAUM e Estranho Produções e distribuição da Lança Filmes. O financiamento é do NRW Film und Medien Stiftung (Alemanha), IDFA Bertha Fund (Holanda) e do Prodecine 5 - Inovação de Linguagem - Fundo Setorial do Audiovisual, através da Ancine e BRDE.



Sobre  Bruno Gularte Barreto


Bruno Gularte Barreto é um diretor, artista visual e educador brasileiro cuja obra transita entre o cinema, a fotografia e a videoarte. Bruno é mestre em poéticas visuais pelo PPGAV da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutorando em Artes Performativas e da imagem em Movimento pelo Curso de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Suas obras integram, entre outras, as coleções do MAM-RJ, MARGS e MAC-RS. Suas áreas de interesse incluem a memória, a autoficção, o corpo, a ruína e a opacidade.

Bruno Barreto e a produtora Jessica Luz em Gramado/RS



5 CASAS
5 Casas
5 Houses
2022
Bruno Goularte Barreto
85 min


Pesado. Muito pesado. Em 10 minutos (eu conferi), eu já estava segurando as lágrimas. 5 Casas aborda temas vitais. Fala sobre solidão, abandono, racismo, malefícios do agro, homofobia, violência policial, especulação imobiliária, escravidão, exploração, sistema de saúde, religião, cristianismo, dor e alegria. Sem parar para discutir profundamente nada, ainda assim, entregando um dos discursos mais contundentes que ví em uma tela. E é só uma característica desse filme. Desde já, creio ser o melhor filme gaúcho que já vi na vida. Um retrato primoroso de como o povo do Rio Grande do Sul pensa e age.

Primoroso é um termo que achei para não ser piegas e chamar de perfeito. Mas é sim uma obra-prima. Vamos lá: o que seria uma obra-prima? Do dicionário (Google):
1.
história
obra que devia realizar todo artesão aspirante a mestre, em sua guilda; obra-mestra. 
2. a mais bela obra de um artista, de uma época, de um gênero etc.; obra-mestra, obra
capital. "a o. de um escritor maldito"

Visto isso, delimitamos que seria uma obra para uma iniciação ao mesmo tempo que usamos para delimitar um limite de qualidade. Como se um autor nunca mais fosse fazer algo tão bom quanto já foi feito. Então, a parte técnica do filme é perfeita. A fotografia salta aos olhos em cada cena lembrando o contraste Kubrickiano em vários momentos. Em outros, cores vivas e recortes da luz que entram pelas frestas de um velho galpão abandonado. Registros que não esquecerei tão cedo. Seria somente por tal qualidade? Claro que não. Tais detalhes técnicos só potencializam a narrativa de vida pessoal do nosso condutor: o próprio diretor da obra, Bruno Goularte Barreto.


Sem explicar de onde veio. Onde se passa esta história que está nos contando. Sem se quer colocar letterings com o nome e “parentesco” dos entrevistados, Bruno começa a nos contar sua vida. Após alguns planos de fotos sendo revelados em meio ao breu pela luz de palitos de fósforo, Bruno começa a explicar a história do seu único autorretrato feito ainda criança. Conta um pouco sobre a sua família e assim vamos entendendo que se trata de um relato completamente real, cru, nostálgico e absolutamente reflexivo.

Bruno vai contando como perdeu seus pais cedo e como perdeu a relação com a cidade onde nasceu. Começamos a ver pessoas contando histórias diretamente para ele que se mantém fora do quadro. Escolhendo com cuidado enquadramentos fechados para seus conterrâneos. Um enquadramento para cada convidado. De acordo com a luz e história contadas entendemos ainda mais o sentimento envolvido nesse gigante registro. Como um documentarista não praticante devo dizer que cada entrevista foi muito maior e mais pesada emocionalmente se apresenta. Fico pensando no tamanho do material bruto e quanta coisa ficou de fora.

Aí vem a montagem, meu grande nêmesis enquanto realizador. Algo com que trabalhei e ainda trabalho em pequenos projetos. Fico pensando como foi essa sala de montagem. O Bruno tendo que rever muita coisa e relembrar incessantes vezes dos sentimentos de sua infância. Ainda assim, nos entrega o melhor. Por mais que possa imaginar outros planos, cenas e relatos, não consigo imaginar algo melhor do que podemos ver na tela. O ritmo do filme não existe. Para mim, nascido e criado em Porto Alegre mas com família de Uruguaiana, com mãe de nome Maria do Horto, que estudou no Horto de Uruguaiana. Que também tive uma mãe preta chamada Maria, essa obra é um piscar de olhos na minha existência. Uma viagem por situações, parentes distantes, ruas parecidas, reconhecendo o embrutecimento do povo gaúcho, etc. Está tudo aqui nesse piscar de olhos que passa lentamente durante 85 minutos de primor técnico.


Devo dizer que fiquei ansioso para ver os créditos. Sabia que teria alguns nomes conhecidos. A começar por Bruno Polidoro na foto. Desde meus tempos de Teccine ouço esse nome. Por mais que estivesse cursando cinema na Unisinos. De todo modo, nunca nos encontramos. Lembro de Pela Passagem de Uma Grande Dor, que dividiu o Cinesquema Novo de 2006 com meu querido filho Toniolo (documentário sobre o pixador maior de POA, segundo o próprio Toni). Logo em seguida, na produção, Paola Wink. Uma caloura gente fina da terceira turma do Teccine. Amiga do Davi, do Carboni, aquela galera massa da Tokyo filmes. Lembro que fomos na mesma excursão para ver o Slayer em SP,2006. Lá pra baixo, ainda aparece o Beto Picasso. Lembro de ter sido apresentado a ele pelo meu grande amigo Felipe Rosa. Ao fim de alguma diária, tomando ceva no Pinguim (não havia tretas naquela época ainda), entre tantos outros.

Faço questão de citar alguns nomes como forma de parabenizar toda a equipe. Voa piazada! Ainda vamos falar muito de vocês!

Como disse: um dos melhores filmes que já vi. Um recorte preciso que o Bruno faz de sua vida e nos entrega com todo o carinho. Não que seja um filme feliz. É um filme sobre a vida e suas desventuras em série. Diria eu: um relato profundo sobre esse povo amargo nascido e criado sobre o Continente de São Pedro e que ainda assim chamamos de amigo, vivente ou família.

Nota: 10. O final. Ah, o final. Que baita plano final. Obrigatório.



5 CASAS

Direção: Bruno Gularte Barreto
Roteiro: Bruno Gularte Barreto e Vicente Moreno
Produção Executiva: Jessica Luz
Coprodução: Bruno Gularte Barreto, Kristin Krieg e Gerd Haag
Direção de Fotografia: Bruno Gularte Barreto, Bruno Polidoro e Tiago Coelho
Montagem: Vicente Moreno
Direção de Arte: Bruno Gularte Barreto
Desenho de Som: Emil Klotzsch
Trilha Sonora: Elza Soares e Emil Klotzsch
Distribuição: Lança Filmes
Personagens: Beatriz Paiva, Irmã Ana Abatti, Irmã Amélia Lain, Ivone Lermen, Maria
Miranda, Maria Sinhorinha, Ricardo Nascimento e Rodier Mendes

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Lança Filmes

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André  Moraes André  Moraes é Cineasta, Escritor e criador do Wasd Space. Também escreve a coluna O Simióide todas as segunda aqui no Coletive em Movimento. 

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