FESTA PARA UM CORAÇÃO PODRE
O sesquicentenário da independência do Brasil foi em 1972, na época eu tinha 9 anos, em plena ditadura militar. Lembro das pessoas balançando bandeirinhas do Brasil, feitas de papel, para comemorar a data festiva. Eu achava aquilo muito bonito, mas não via lógica em gastar dinheiro em bandeirinhas que lembravam a bandeira do Império. Afinal a historinha das matas e riquezas do país é só lorota, o retângulo verde remete à Casa de Bragança (a família de dom Pedro I) e o amarelo era a cor da Casa de Lorena (da arquiduquesa dona Leopoldina, esposa de dom Pedro I).
Pedro de Alcântara Francisco António João Carlos Xavier de Paula Miguel Gabriel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon, o velho D. Pedro I , famoso pelas traições e casos extraconjugais além das agressões físicas a imperatriz Dona Leopoldina me faz lembrar os homens defensores da família, com a bíblia no sovaco, que vemos hoje. Dom Pedro governou entre 12 de outubro de 1822 e 7 de abril de 1831 até renunciar o trono em favor de uma criança de 5 anos , abandonando o filho para voltar para Portugal. Seu reinado foi complicado porque ele era autoritário, não aceitava ser contrariado, e isso gerou atritos com parte da elite brasileira. Acumulou problemas pessoais em razão de seu relacionamento extraconjugal com a Marquesa de Santos.
Ao abandonar o trono, o país e o filho, o monarca deixa claro em testamento que deseja que seu coração permaneça na cidade do Porto após a sua morte e sua vontade está sendo respeitada, o órgão normalmente fica guardado em uma urna de madeira trancada a cinco chaves na Igreja de Nossa Senhora da Lapa, localizada na cidade do Porto, noroeste de Portugal. Em nenhum momento ele pediu para que seu coração fizesse turismo. "Ora pois, então porque raios" temos que bancar o passeio de um coração fora do peito do monarca e dos brasileiros? Com tanto por fazer nesse país que não era digno de guardar um coração inútil de um monarca machista e violento, jogamos pela janela de um avião uma quantia considerável de dinheiro para fazer festa para o diabo rir.
Vejo pela TV a repetição de cenas da ditadura militar: bandeirinhas com as cores do império presas em palitinhos de churrasquinhos inúteis pela falta de carne no prato do pobre e militares carregando a urna com os restos mortais de um homem que não queria seu coração nesta terra. E os homens de bem, fardados e com a bíblia no sovaco saudando um pedaço podre de carne enquanto poderiam salvar um coração que ainda bate, abandonado nos hospitais sucateados e sem medicamentos, rotina de todo o país.
Dinheiro que seria mais útil se fosse usado pelos brasileiros vivos.
Isab-El Cristina Soares |
Isab-El Cristina Soares é poeta, membro do Clube Literário de Gravataí, autora de 6 livros. Graduada em Letras/ Literaturas, pós-graduada em Libras.
Escute o episódio do podcast Coletive Som gravado com Isab-El , clicando Aqui.
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4 Comentários
É uma homenagem necrófila e ridícula que só é valorizada por quem nunca estudou a história desse país, fora dos livros escolares.
ResponderExcluirVdd. A história ensinada nas escolas é uma utopia bonita. Mais estória q um conto de fadas.
ExcluirTexto muito bom!!! Perfeito.
ResponderExcluirObrigada, Tânia.
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