ISSO DÁ UMA CRÔNICA

 

Vai tomar na Cuba, sua PTinha satanista!

Não sei se vocês já perceberam, mas eu não sou exatamente Felipe Neto. Nem Anitta ou Gregório Duvivier, que alcançam um grande público e conseguem, através da sua arte, formar opiniões. Eu com minhas crônicas, não. Eu jurava – e eis uma coisa que me deixava incomodada – que estava pregando pra convertido. Fortalecendo, isso sim, opiniões já estabelecidas e parecidas com a minha, e criando uma sensação de união ideológica com os meus leitores, mas sem conseguir furar a bolha.

Pois, estava enganada.

Foi no meio tempo entre os dois turnos das eleições que recebi meus primeiros comentários de ódio. Na verdade, não fiquei tão surpresa pelo fato em si – os bolsonaristas não são exatamente conhecidos por seus discursos eruditos. Eu fiquei surpresa foi com a crônica que escolheram para isso. Foi justamente “Pré-pagando promessa” – na minha opinião o texto mais bobo que já escrevi. O que eu queria mesmo era ter escrito algo grandioso, algo que fosse capaz de virar votos e tudo mais, mas o que saiu foi uma crônica meio besta sobre subversividade política no pilates.

Ou seja: eu não estava nem falando mal do candidato deles. Tampouco estava chamando a atenção sobre esquemas de corrupção no governo Bolsonaro, nem sobre os 51 imóveis comprados com dinheiro vivo, nem sobre rachadinhas, funcionários fantasmas ou aquele motorista que passava cheques para a esposa do sujeito, nem sobre os milhares de brasileiros que poderiam estar vivos hoje se o governo não tivesse negligenciado a vacina, nem sobre homenagens a torturadores e milicianos, nem sobre a jetskiata presidencial que durou 4 anos, nem sobre o desmatamento devastador na Amazônia ou os cortes na Educação, na Saúde e no salário mínimo, nem sobre o descaso do governo com a fome que atinge 33 milhões de brasileiros, nem sobre a compra de votos e outros crimes eleitorais, e também não sobre os sigilos de 100 anos ou o orçamento secreto. Não estava falando de nada disso. Estava somente dizendo que mandava todas as energias possíveis ao universo para que Lula ganhasse as eleições. E que por isso, no pilates, repetia cada movimento 13 vezes em vez de 12. Só.

Mas eu sempre digo que leitor é um bicho estranho. Eu achei a crônica bobinha, mas outros não acharam. Acharam ela digna de comentários odiosos, olha só! E não foram dois ou três, foi uma enxurrada. Entre os xingamentos básicos e convites para visitar determinados países sul-americanos e do Caribe ou para voltar à Alemanha, houve quem me chamasse de satanista – ri que só com essa! –, outros que me sugeriram ter relações sexuais com Lula – fico lisonjeada com a confiança no meu poder de sedução, mas fora do campo político ele não faz muito meu tipo –, e teve ameaças também.

Mas vou lhes falar uma coisa: não adianta me mandar pra Venezuela, até porque já fui. Fui e encontrei o país tão polarizado como o Brasil que vemos hoje, com famílias rachadas pelo ódio político. Fui e encontrei as pessoas com medo umas das outras, medo da violência e da morte facilitada por tantas armas que circulavam livremente, armas liberadas lá e cá. Fui e encontrei o povo sofrendo com uma superinflação, que a cada dia lhes permitia comprar menos com o salário. Do lado de lá, filas para comprar papel higiênico, do lado de cá, fila para comprar osso. O Brasil depois de 4 anos de Bolsonaro é mais parecido com a Venezuela do que foi em todos os governos do PT.

Mas na verdade já cansei de escrever sobre isso. Acabou. Lula ganhou. A humanidade, a Amazônia e a democracia agradecem. E eu também agradeço. A vocês. Porque jurava que estava pregando pra convertido, que não conseguia furar a bolha. Mas estava enganada. Vocês fizeram com que eu me sentisse importante. Muito obrigada!


Yvonne Miller

Yvonne Miller 
nasceu na cidade de Berlim em 1985, mas mora, namora e se demora no Nordeste do Brasil desde 2017. Atualmente vive em Pernambuco, no meio da Mata Atlântica, junto com sua esposa Larissa, sua enteada Morena, o gato Salém e o cachorro Chico. Escreve contos, crônicas e literatura infantil em alemão, espanhol e português. Tem textos publicados em coletâneas, como Paginário (Aliás Editora) e Histórias de uma quarentena (Expresso Poema Editora). É colunista do coletivo de cronistas nordestinas @bora_cronicar e do blog Escritor Brasileiro. Além de ficcionista é autora e redatora de livros escolares.

Instagram: @yvonnemiller_
 


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1 Comentários

  1. Yvonne, também sofro com os ataques insanos do gado enfurecido pelas minhas crônicas e também me fortalece. Na verdade em muitos casos eu ligo o foda-se kkk. Na vdd as ofensas de desconhecidos me fortalecem e as dos conhecidos me deixam confusa pois percebo q não os conhecia como acreditava. Dói ver amigos tentando me magoar, mas até isso passa. Tua crônica, como todas as q já li, está maravilhosa. Continua. Bju no teu coração.

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