NAVALHAS AO VENTO

 PL 1904/2024 - CRIMINALIZANDO A VÍTIMA

No dia 16 de agosto de 2020 o site www.brasilelpais.com nos surpreende com a notícia que “criança de 10 anos que engravidou após ser violentada por um tio em São Mateus, no Espírito Santo, começou o procedimento de aborto neste domingo, após o Tribunal de Justiça do Espírito Santo conceder a ela o direito previsto na lei brasileira de interromper uma gravidez fruto de um estupro.” Esta notícia causou a revolta dos “conservadores de cuecas na mão” que acusaram a criança de assassina.

Quatro anos depois o Brasil retrocede 500 anos quando a Câmara dos Deputados aprova em 13 de junho a PL 1904/2024. No site www.brasildefato.com.br podemos ler, assombrados, a notícia que: “A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (12), a tramitação em regime de urgência do  projeto de lei que equipara aborto acima de 22 semanas a homicídio simples . Agora, o PL 1904/2024 será votado no plenário da Casa, sem passar antes pelas comissões pertinentes.”

O PL foi proposto pelo deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e assinado por outros 31 deputados. A maioria deles são do Partido Liberal, o mesmo do ex-presidente Jair Bolsonaro, porque não me surpreendo? Desgraçados que assinaram a PL do crime, por sigla:

PL: Carla Zambelli (SP), Delegado Paulo Bilynskyj (SP), Mario Frias (SP), Eduardo Bolsonaro (SP), Abilio Brunini (MT), Coronel Fernanda (MT), Delegado Ramagem (RJ), Bia Kicis (DF), Pastor Eurico (PE), Capitão Alden (BA), Julia Zanatta (SC),  Nikolas Ferreira (MG) , Junio Amaral (MG), Eli Borges (TO), Gilvan da Federal (ES), Filipe Martins (TO) e Bibo Nunes (RS).

MDB: Delegado Palumbo (SP), Simone Marquetto (SP), Renilce Nicodemos (PA) e Pezenti (SC).

União Brasil: Cristiane Lopes (RO) e Dayany Bittencourt (CE).

Republicanos: Ely Santos (SP) e Franciane Bayer (RS).

Partido Progressistas: Evair Vieira de Melo (ES) e Luiz Ovando (MS).

E de outros partidos: Dr. Frederico (PRD/MG), Greyce Elias (Avante/MG), Lêda Borges (PSDB/GO) e Cezinha de Madureira (PSD/SP).

Todos “cidadãos de bem, que defendem a família, Deus e a pátria” que em suas demagogias estão criminalizando apenas as famílias pobres. Oras, duvido que se for a filha de algum dos ilustres deputados que seja estuprada e em decorrência engravidar, não fará o aborto em uma clínica particular ou até em outro país, mas a filha da família pobre terá que levar a gravidez adiante, penalizando duplamente a vítima.

Vamos tentar um exercício de empatia? Tua filha é vítima de estupro e engravida. Qual será a tua relação com esta criança? Sem demagogia, tu tens certeza que conseguirá amá-la como neto? Se tua filha foi criança, tu deixará que ela perca a sua infância para se tornar mãe? Desde quando criança é mãe? Criança é criança, tem que brincar e estudar. Só falta seguirem a bíblia ao pé da letra e quererem que a criança case com o estuprador.

Eu lembro que quando eu cursava letras na Ulbra, na cadeira de Cultura Religiosa teve um debate sobre aborto e eu sempre me posicionei a favor. Não a favor do aborto, mas a favor de que só a mulher pode avaliar o que ela quer fazer. Mesmo que não seja por estupro, para mim quem decide se quer continuar a gravidez é somente a mulher. Somos donas do nosso corpo e defendo isso. No debate da Ulbra uma colega me acusou de ter feito aborto em algum momento da minha vida. Respondi que não. “Eu não precisei recorrer ao aborto –  respondi – mas tu tens cara de que já fez algumas vezes.” A colega saiu chorando da sala e foi quando eu soube que ela havia feito três vezes.

Isso é muito normal, a demagogia visando a manipulação, a hipocrisia da santidade, o interesse em prejudicar a classe pobre, tudo isso faz parte de um projeto de enriquecimento de uma fatia da população em detrimento dos demais são artimanhas usadas pela direita. Enquanto a menina deveria estar na escola, estará em casa cuidando de outra criança e isso a impossibilitará de ver possibilidades de crescimento, ou seja, não terá condições de sair da vila, da favela, da miséria em que vive. Já a filha do abastado fará o aborto em silêncio, sem que a mídia saiba.

O caso nem é o aborto, lembram do caso da Klara Castanho? Descobriu a gravidez, fruto de um estupro e decidiu ir adiante com a gravidez, optando por deixar a criança para adoção. Lembram do quanto ela foi julgada? O povo de direita não se interessa pelo teu bem estar, só quer empatar a vida das pessoas.

Bota a mão na consciência e revê teu posicionamento. O aborto só é crime enquanto a tua filha ou tua amante não ficar grávida, daí passa a ser “defender a família”?

Isab-El Cristina Soares


Isab-El Cristina Soares é poeta, membro do Clube Literário de Gravataí, autora de 6 livros.  Graduada em Letras/ Literaturas, pós-graduada em Libras.

Escute o episódio do podcast Coletive Som gravado com Isab-El , clicando Aqui.

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