
O Pessoa
Conheci o Pessoa já não me lembro quando, mas foi lá pelo começo da década de 90 do século passado, quando ele se casou com a Marisa, filha de uma das melhores amigas de minha mãe, e que se criou conosco na antiga Manoel de Almeida em Alvorada City, mas só fui estreitar laços com ele em 1995, quando começamos a nos reaproximar dela. Eles moravam em Santa Rita, bairro da cidade de Guaíba/RS, e as nossas viagens até lá se tornaram frequentes.
As vezes eram um frio de gelar os ossos, as vezes um calor insuportável, mas era uma alegria só. O Pessoa era divertidíssimo, alegre, brincalhão, sempre com um sorriso que escancarava os dentes, igual ao gato de Yorkshire da Alice de Lewis Caroll.
Com ele aprendi a fazer pão, a beber vinho branco (que rapidamente desisti após uma ressaca de um porre tomado ali mesmo) e a viver o momento, relaxar, deixar ir o que incomodava e apenas estar, sonhar.
Pessoa, eu e a gurizada que frequentavam a sua casa ficávamos até tarde conversando, rindo, fumando um baseado (sim, naquela época eu fumava). Pessoa sonhava em construir um segundo andar na casa dele, com uma sacada virada para a BR 116 para ficarmos "viajando" olhando os faróis dos carros passando, tentando adivinhar os seus rumos, os seus destinos, ou apenas ficar admirando.
Pessoa fez de mim e de minha irmã seus compadres, nos deu seu filho Carlinhos para batizamos na igreja (confesso que temi pegar fogo durante a cerimônia), um sinal de carinho e respeito.
O tempo passou, Marisa e o Pessoa se separaram, voltaram e tornaram a se separar.
Pessoa foi embora de Santa Rita, mas nós nos reuníamos com frequência, não a de antes, mas a gente se via, e sempre quando acontecia era ele com aquela boca escancarada, os braços abertos e o grito: Compadreee!
A última vez que vi o Pessoa, minha ex esposa estava grávida do Peter, meu primeiro filho. Dali em diante fomos perdendo o contato, apenas notícias, que ele tinha se casado e tinha um casal de filhos com a nova esposa.
Alguns anos depois descobri ele no face e enviei solicitação de amizade, ele não aceitou, nunca soube o porquê, mas fiquei com a sensação que um dia voltaríamos a nós encontrar e tudo voltaria ao normal.
Hoje ao consagrar o rapé sagrado, me veio a miração dele, uma lembrança dele pescando um mussum, que depois nós fritamos e comemos em sua casa. Senti saudades e fui procurar ele nas redes sociais para saber como estava.
Me deparei com sua página pessoal com a descrição "Em memória de Carlos Pivetta". Faziam cinco anos que já havia falecido.
Fiquei ali parado, olhando, triste...
Me dei conta que já faziam dez anos que havia lhe enviado solicitação de amizade, que faziam 24 anos desde a última vez que eu o havia visto e suspirei, o tempo passou rápido demais.
A gente vai envelhecendo e a nossa vida vai se acumulando de despedidas, lembrei-me do trecho da música Sangue Latino dos Secos e Molhados: "Minha vida, meus mortos, meus caminhos tortos, meu sangue latino, minh'alma cativa".
Pessoa foi marcante, foi compadre, foi amigo. O tempo, a distância e a vida aconteceram.
Hoje escrevo para me lembrar dele, para deixar registrado as saudades que sinto do Carlos Pivetta, o Pessoa.Chamava ele de Pessoa, porque ele chamava a todos assim: "e aí pessoa!
Lembro-me que uma vez passou uma moça muito bonita passou por ele (eram amigos) e ele falou para brincar com ela: como você é linda. Ela querendo fazer um charme para nós que presenciamos, falou: pena que eu não posso dizer o mesmo de ti, ele parou , olhou e falou: "faz que nem eu, mente!"
Fechei o notebook, fui até a janela do meu apartamento, sentei e fiquei vendo os carros passarem, tentando adivinhar os seus rumos, os seus destinos e falei baixinho: "Tchau Pessoa".
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Arte: Lisi Olsen "Quanto mais arte, menos violência. Quanto mais arte, mais consciência, menos ignorância." - Ricardo Mendes COLETIVEARTS, 06 ANOS DE VIDA, CONTANDO HISTÓRIAS, CRIANDO MUNDOS! O COLETIVE TAMBÉM É SAUDADE! SIGA-NOS EM NOSSAS REDES SOCIAIS: e-mail: coletivearts@gmail.com |
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