A Arte do Conflito
Chegamos a esta terceira história das Aventuras do Detetive Oswaldo. Particularmente é uma das que eu mais gosto e, talvez, porque foi um grande desafio, afinal, ter como pano de fundo um importante acontecimento histórico aumenta a responsabilidade. Não deixa de ser um vício de ofício, igual àquela máxima: “de tanto fumar cachimbo a boca ficou torta”. O sujeito lecionou História por trinta e três anos, agora, para abordar um tema histórico numa obra de ficção, além de ser fascinante, é um desafio que leva ao conflito ou, melhor dizendo, aos conflitos, desde políticos, filosóficos até íntimos, da nossa própria consciência e história de vida.
Pode parecer irônico, pois, no livro anterior, abordei os efeitos terapêuticos da escrita, agora lanço luz sobre o conflito, aquele atrito que pode gerar uma faísca capaz de colocar fogo na floresta da ignorância e do preconceito. Na verdade, estar bem consigo mesmo não é, necessariamente, estar em paz (afinal, ninguém quer a “paz dos cemitérios”!). O conflito, este movimento dialético, faz parte das nossas vidas e, ouso afirmar, nos move, impulsionando-nos para frente, não poderia deixar de estar presente na escrita de um texto, ainda mais quando o autor tem pretensões literárias. Aliás, nenhuma história é interessante sem o conflito, ou melhor, nenhuma história existe sem conflito. Escrever é desagradar alguém. O autor, mesmo que queira, não consegue se manter neutro, suas posições políticas manifestas, mesmo que não explicitadas, no seu texto vão desagradar e desacomodar alguém ou “alguéns”.
Considero interessante esta relação conflito, vida e escrita, porque As Aventuras do Detetive Oswaldo se movimentam, ou melhor visualizando, surfam na gigantesca e emocionante onda do conflito (dá medo, mas é excitante). Quando escrevi estas histórias, muitas vezes entrei em becos sem saída, não tive capacidade de ver uma porta ou se quer um murinho que eu pudesse pular. Tive que voltar e buscar um outro caminho, mudar o rumo da história, o que provocava angústias na busca de saídas, na escolha de palavras, talvez nem sempre as mais corretas, que solucionassem o problema, que superassem aquele conflito, por isto, posso afirmar que os conflito gerados e superados são as lenhas colocadas na caldeira da locomotiva da criação destas histórias, fazendo as rodas girarem, mesmo que, ali na frente, acabem os trilhos.
Agora, vamos combinar, se o autor tem conflitos internos aos escrever uma história, imagina só os conflitos externos, isto é, com a outra ponta do novelo: o leitor? Uma incógnita, o inesperado está diante do escritor ao colocar sua obra diante do olhar dos outros. Ninguém, ao colocar um ponto final no seu texto, tem a certeza de que agradará aos seus eventuais leitores (também chamados de “pobres vítimas”). Acho que a única regra, ou melhor, a única certeza neste mar de dúvidas é a seguinte: quem escreveu tem que gostar do que escreveu. A não ser, é claro, se o sujeito é um destes cínicos publicitários que escrevem qualquer coisa para vender um produto, tentando nos convencer a comprar mais uma inutilidade doméstica, entulhando as nossas vidas.
Outro aspecto, nesta relação autor-leitor, já aqui citado, é o conflito, desta vez o de opiniões. Afinal, não existe nenhuma obrigação do autor e do leitor terem a mesma opinião. Claro que o leitor não vai gastar seu dinheiro e nem seu tempo lendo o que não lhe interessa, mas é preciso haver um mesmo norte filosófico, político, existencial, até mesmo quando se lê opiniões completamente divergentes, por exemplo: posso ler Mein Kampf, com suas ideias belicosas de dominação de outros povos e superioridade racial/racismo, tão explicitas que chocam qualquer um que tenha pretensões humanistas e, ao mesmo tempo, por serem tão antagônicas, principalmente pelas suas comprovações históricas (holocausto de negros, ciganos, eslavos, homossexuais, semitas, principalmente os hebreus), acabam provocando uma reação contrária, uma repulsa tão forte que, ao final, reforçam princípios de amor à humanidade/natureza/planeta/vida. Irônico, não é mesmo?
Enfim, o autor, por ser humano e viver neste momento histórico, não tem a obrigação de ser neutro (qualidade de alguns shampoos), mesmo quando escreve sobre o passado. Na verdade, considero que, inconscientemente, estamos sempre revelando quem somos, mais do que pelas palavras ditas/escritas, pelas nossas ações e omissões. Por isto, o ato de escrever revela-nos aos leitores, que podem gostar ou odiar, mas, o mais importante, não podem ficar indiferentes.
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