O FOTÓGRAFO

O fotógrafo Didier Lefèvre fez diferente no conteúdo básico de uma hq, uma experiência nova para os quadrinhos. A principal mudança é a quebra pragmática tradicional de produção: Roteiro, Desenhos, Arte-final, cor, letra, etc. Vamos tomar como exemplo alguém fotografando a cidade: Restaurantes, Ruas, Farmácias, Mercados, Lanchonetes... Depois passaria a tirar fotos em outra linha de pensamento (ou uma visão diferente), como de pessoas conversando, cachorros “caramelos”, carros estacionados, crianças saindo da escola, dinamismo do hospital recebendo os enfermos, uma discussão de casal, etc. Entrega as fotos para um outro artista e simplesmente organiza as imagens e faz a HQ, mas sem uma certa sequência. Este escolhe as que combinam e edita como se fosse uma fotonovela. Essas imagens vão para o desenhista e este faz uma alusão às imagens, mas sem conhecer o que está por trás das imagens.
Didier Lefèvre foi para a sua primeira viagem ao Afeganistão junto com uma equipe de Médicos Sem Fronteira, ajudando sem receber algo em troca, no período da invasão soviética. Em 1986. Ele registra tudo que é possível e mostra o medo no rosto de crianças e o desespero de dezenas de pessoas arriscando a vida para salvar outras dos militares russos.

A narrativa é em primeira pessoa, como um tipo de documentário. Dá até pra imaginar o fotógrafo gravando as “falas” enquanto visualiza as fotografias e, diante disso, o roteirista junta as peças para enxugar o material para o desenhista. Um tipo de Diário pessoal que traz lembranças boas e ruins (a maioria) em cada foto.
Um detalhe que não se pode deixar de lado é saber que tudo aquilo foi real, todas as pessoas nas fotografias sofreram na guerra. Muitas tiveram a vida ceifada sem nem mesmo saber o motivo. A falta de humanidade mostra claramente o quão sortuda é uma pessoa que tem onde dormir, o que comer e se vestir, sem se preocupar se vai estar vivo ou não nas próximas horas.

Didier acompanhou o grupo apenas pra registrar o trabalho dos Médicos e acabou seguindo outros caminhos, pois não imaginava que conheceria pessoas interessantes, que sentisse o sofrimento delas. Toda essa magia perigosa o fez voltar outras vezes fotografar o trabalho dos Médicos passou a ser irrelevante e registrou também em um diário a felicidade de pessoas conseguirem voltar para casa, a tristeza dolorosa de médicos chegarem tarde demais, a bondade de todos em proteger desconhecidos e uma mulher que teve que se vestir com roupas masculinas pra poder se passar por homem e negociar em algumas situações.
A obra nos faz refletir o quanto podemos ser humanos não sendo machistas, esquecendo vinganças, nada de desmerecer mulheres, protegendo crianças a todo o momento. Há claramente a sensação de amor e bondade entre todos. HQ nem precisava de diálogos. As imagens falam por si.
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