FORA DE SÉRIE

 Chespirito: Sem Querer Querendo

Se você tem 50 anos, cresceu assistindo ele. Se tem 40 também. Se tem 30 também. E se tiver 20. Aliás, se você tiver 10 também. E menos.

Chespirito, foi o Chico Anísio do México. Criador de mais de 100 personagens de humor para a TV mexicana. Dentre eles: Doutor Chapatin, o médico neurótico e diluviano. Chapolin, o super herói mais atrapalhado de todos os tempos. E Chaves, o órfão mais inocente e ao mesmo tempo levado, do mundo.

Chespirito levou seus personagens para mais de 80 países e se tornou um fenômeno, sendo o motivo de risos em pelo menos 3 gerações. Minha avó morreu às vésperas de completar 75 anos, imitando o "Gentalha, gentalha" do Quico e se engasgando de rir com o Chapolin. E já fazem 30 anos que ela se foi.

A série conta sua trajetória desde a infância, onde surgem as primeiras inspirações, como a vila onde morou e o chapéu que ganharia de presente e que cobriria a cabeça de seu mais famoso personagem, passando pela juventude, fazendo parte do clube de amigos do bairro, com seus irmãos e conhecendo Graciela, que se tornaria sua esposa e mãe de seus 6 filhos.  

A história acompanha como nasce o sonho de ser mais na vida e a vontade de fazer as pessoas rirem. Seu início na televisão e como nascem seus personagens, com os bordões característicos, que nascem de situações da infância e da própria vida adulta. A amizade leal de Ramon Valdez, Maria Antonieta de Las Nieves, Edgar Vivar, Ruben Aguirre, Angelines Fernandez e de seu irmão Horácio. As desavenças com Carlos Villagrán (que aqui aparece com outro nome, por motivos óbvios) e o início do amor com Florinda Meza (também com outro nome) e a ruína em seu casamento.  

A série, produzida pelos filhos de Chespirito, é claramente uma defesa de Graciela, sua mãe, pela dor que sentiu até o fim da vida, em ser trocada por Florinda, mas também uma clara vingança deles contra a atriz e contra Villagrán. 

Florinda (que não série se chama Margarida), apesar de claramente apaixonada por Chespirito, é retratada como uma desagregadora sem espírito de equipe (o que de fato foi comprovado por relatos de vários de seus ex-colegas), mas parece que a mão da vingança pesa em demasia. Como na ocasião em em um diálogo com um desafeto, Chespirito diz a seguinte frase: “Aprendi a nunca confiar em pessoas com nome de flor” (FLORinda /Margarida…sacaram?).  

Carlos Villagrán (na série chamado de Marcos Barragán) é o que recebe a maior dose de escrotidão. Retratado como um deslumbrado com a fama, ingrato a Chespirito, que fazia piadinhas desnecessárias o tempo inteiro, constrangendo seus colegas e que faz o possível para lucrar mais, sempre acusando Chespirito de enriquecer a suas custas, já que não sua visão, Quico era maior que Chaves. 

A atriz Florinda Meza prometeu processar os enteados. Villagrán não se pronunciou, embora sua filha tenha feito várias postagens em seu perfil de Instagram, defendendo o pai e chamando os filhos de Chespirito de mentirosos. 

Mas, afora os dissabores dos bastidores (como no episódio mais emotivo de todos para os fãs, em Acapulco, que foi um caos do início ao fim e que decretou a ruína, do que era uma família) e alguns erros de continuidade, a série tem aquele sabor de nostalgia que se esperava e para quem vive de arte e inspiração, é um jóia em um relicário. Um pedaço de valor, pra se guardar do lado esquerdo do peito. Inspirador, emocionante (a cena do elenco, encontrando crianças emocionadas ao vê-los é de se gastar muitos lenços de papel) e um abraço quente no coração. 

Chespirito: Foi Sem Querer Querendo não é uma obra prima. Mas é um poema de amor ao riso, a alegria e a inocência. 

Chespirito não foi perfeito. Errou e errou feio, com quem mais lhe amou. Mas foi um apaixonado pelo riso e por fazer rir. Um incansável na arte de alegrar. Isso lhe custou um alto preço. Mas acredito que em meio a tanta dor, ele conseguiu encontrar momentos para sorrir. Não tantos quanto os nossos, assistindo seus programas. Mas encontrou. 

Isso, isso, isso… 

Chespirito: Foi Sem Querer Querendo está disponível na HBO Max e Prime Vídeo.

TRAILER:

Davison Silveira

Davison Silveira é escritor e sonhador. Não ganhou dinheiro com nenhuma das duas, mas continua achando que as respostas da vida estão em alguma canção do Belchior, num disco de Dylan, num livro de Kundera, numa revista do Asterix e nos beijos de Denise. Para ele o sentido da vida é Centro-Bairro. E segue sua vida esperando o retorno daquele que veio dos Céus para nós salvar: Goku. Ou que finalmente resolvam fazer a versão 600 ml do refrigerante Teem

"Quanto mais arte, menos violência. Quanto mais arte, mais consciência, menos ignorância."

- Ricardo Mendes

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