FISSURAS NA QUARTA PAREDE

OPINIÃO

 Feliz Novo Velho Ano...

Um ano de escolhas!

Um paradoxo diante de um ano que parece não ter nos dado escolhas. A impotência vivida diante de nossos olhos. Como escolher?!

Por ironia do destino, este ano que se finda e deixa como legado ao Novo Ano seus resquícios, talvez, tenha sido o ano das mais importantes escolhas de nossas vidas. Um ano que começou e terminou demoradamente rápido. Quantas escolhas tivemos que fazer em 2020? Desde procurar outro emprego, se reinventar, abrir mão do que estava cômodo, “organizado” em nossas vidas. Escolher viajar ou não viajar, usar máscara, lembrar o álcool gel, conhecer novas tecnologias, fazer e assistir Lives, se informar e trabalhar de forma online, ressignificar conceitos, repensar compras e
consumo, escolher horários, escolher não abraçar, escolher onde comer e quem
visitar, escolher manter a calma, escolher soluções, escolher não escolher, escolher
viver...

A lista que parece nunca terminar poderia ir preenchendo os espaços vazios. A todo o momento estamos diante de escolhas, ainda que imperceptíveis a um olhar pouco atento, e na eminência do caos é quando nos deparamos com a maior delas: seguir ou paralisar. Encontrar soluções ou problemas. Temos a escolha de estar abertos aos sinais do que a vida quer nos ensinar e criar outros caminhos – a isso chamamos sabedoria – ou nos limitamos a esperar.

Há quem esteja sempre esperando. Esperando o dia passar, a noite chegar, a oportunidade dos sonhos, o emprego irrecusável, o amor perfeito, o sol, a chuva, o
milagre, o final do ano, o próximo ano... E na constante inércia de não-ações continua
em sua tarefa lamuriosa, em um canto da sala, tentando ser ouvido. Um ato
revolucionário, pensa ele, ao chegar perto do último do ano, quando consegue apagar
1/3 de seus 459 grupos de whats, toma um banho de limpeza, separa sua roupa nova
e brinda... No Ano que vem tudo vai ser diferente! Vou começar a fazer exercícios,
comer de forma mais saudável, organizar meus horários, meus arquivos, meu armário.
E o que mais eu vou dizer que vou fazer e, na verdade, não vou?! Não se pode esperar o “novo” quando se continua agindo da mesma “velha” maneira.

Drummond escreveu: “Quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial. Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão. Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí, entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui para diante vai ser diferente.”
Drummond foi genial.

Não, esse não é um texto pessimista. Ao contrário. É quase um apelo otimista,
cansado já, é verdade, mas ainda assim um apelo de não esquecimento e de atitudes.
Um ano com quase 200 mil mortos em nosso país em decorrência da Covid-19, com
milhões de infectados, com tantos absurdos, tantas decisões incabíveis, não pode ser
esquecido. Não se pode, simplesmente, deixar para trás no calendário e achar que
tudo, agora que o número mudou, vai ser melhor. Não é que eu não goste de Anos
Novos e suas comemorações de esperanças renovadas. Não me entenda mal. Eu sou
das Humanas, logo, a lógica matemática de troca de anos nunca me atraiu muito.
Prefiro olhar para as pessoas e seus movimentos. Há que se ter esperanças, acreditar,
mas principalmente, se movimentar. Paulo Freire, em sua Pedagogia da Autonomia,
ressalta a importância de se ter esperança – “Mas a esperança do verbo esperançar porque esperança do verbo esperar é espera. Esperançar é se levantar, ir atrás, construir, não desistir, é levar adiante, é juntar-se com outros para fazer de outro
modo...”

O que se começa de fato em um “Novo Ano”?! Ou seria, o que se pode continuar ou descontinuar de um “Velho Ano”?! Como “fazer de outro modo” para se ter outros resultados... Estamos todos cansados, exaustos eu diria. Mas para alguns o peso é sempre maior, pode ter certeza. Então, olhe para você, olhe ao seu redor, e seja sincero consigo mesmo (ainda que uma única vez): O que VOCÊ está fazendo, de fato, para mudar as coisas?!

Não é à toa que a conjunção entre Júpiter e Saturno ocorre sob o signo de Aquário neste 2021. Para os que acreditam, há de se ter persistência (Saturno) para expandir (Júpiter) e quem sabe até viver em uma Nova Era. A tão esperada Era de Aquário e suas revoluções humanas, tecnológicas e científicas, comentada desde a década de 70. Em outras palavras: ter atitudes, responsabilidades, para enfrentar os desafios e ir em busca de crescimento e novos conhecimentos, com consciência de coletivismo, liberdade e respeito ao outro.

Seja acreditando em astrologia ou não, parece muito evidente o que 2020 veio nos ensinar e continuará nos mostrando em 2021, 22, 23 talvez... Não se trata de
otimismos, crenças ou descrenças, se trata de escolhas, novamente! Escolhas
individuais que ressoam coletivamente. Que partem de mim, mas transbordam para
além dos meus limites particulares. Escolhas que resultam em ações, que por sua vez,
identificam quem eu sou e que lugar ocupo nesse entrelaçamento de corpos diversos,
mentes pulsantes (algumas nem tanto) e, sobretudo, que lado da História eu quero
estar nessa evolução (se é que você acredita em evolução...)  



Izabel Cristina é Licenciada em Teatro, gestora de cultura e Especialista em Acessibilidade Cultural, atriz, dramaturga, diretora e professora de teatro. Desde 2014 coordena o Departamento de  Artes Cênicas da SMCEL- Secretaria Municipal de Cultura, Esporte e lazer de Gravataí/RS





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