CONTATOS ENROLADOS DO TERCEIRO GRAU


 As aparências enganam

Era noite, chovia e a delegacia estava sem movimento. O marasmo de sempre, naquela cidade do interior. Detetive Pereira estava de plantão, jogando pife com o carcereiro, quando dona Marta entrou esbaforida.

Dona Marta era uma senhora de seus 70 e poucos anos, conhecida na cidade pelas boas obras junto aos asilos e orfanatos. Vivia sozinha em um casarão herdado dos pais. Chegou a ficar noiva na juventude, mas o pretendente fugiu com sua irmã às vésperas do casamento. Nunca mais viu os traidores e evitava falar sobre o assunto. Todos na cidade admiravam-na pela força e extrema bondade dedicada aos animais de rua. Tinha fama de ser uma pessoa pacífica, incapaz de matar uma mosca. Por esses antecedentes, Detetive Pereira ficou surpreso quando ela confessou ser uma assassina.

– Não aguentarei viver com esse peso na consciência – confessou ela.

E começou a contar os detalhes do crime.

Naquela noite, ela estava saindo do banho quando ouviu um barulho vindo da sala.  Hesitou um pouco, afinal, tinha certeza de estar sozinha, mas decidiu ir até lá. Ao chegar no ambiente, levou um susto ao dar de cara com “ela” (dona Marta só se referia à vítima assim). A presença “dela” transtornou dona Marta. Não queria acreditar que “ela” estava ali a poucos passos, ameaçando-a. Dona Marta gritou, pediu ajuda aos vizinhos, mas ninguém a ouviu. Tentou pedir auxílio pelo telefone, mas estava mudo.

– E “ela” ali... me ameaçando... Foi quando eu lembrei que tinha uma arma no armário. – disse nervosa dona Marta.

Detetive Pereira, surpreso, pensava: “Dona Marta, quem diria, tinha até uma arma escondida...”

Lembrou-se de um caso semelhante de uma velhinha que tinha esquartejado toda a família após servir uma sopa envenenada. A anciã escondeu os restos em um poço desativado nos fundos do sítio. Só foi descoberta porque um vizinho enxerido tentou pegar água no local e, ao subir o balde, deu de cara com dois dedos putrefatos.

Agora, também, dona Marta, com aquele ar frágil, mostrava sua real face.

O detetive concluiu: “Imagina… E todos diziam que ela era incapaz de matar uma mosca. Ninguém, absolutamente ninguém, está acima do bem e do mal”.

E dona Marta continuou a narrar o horrendo homicídio. De posse da arma, correu até a sala e olhando para “ela” disparou sem piedade.

– MATEI!!!!! _disse dona Marta com brilho no olhar

Trêmula, tirou da bolsa a “arma mortífera”: um tubo de aerossol.

– Matei aquela mal-di-ta barata!



Miriam N. Dohrn jornalista, escritora e mestre em design.

04 ANOS DE COLETIVEARTS,
CONTANDO HISTÓRIAS, CRIANDO MUNDOS
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1 Comentários

  1. Parecida comigo kkk. Também morro de medo e qdo consigo chegar perto o suficiente p laçar spray, sinto-me grandiosa kkkkk.

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