Escrever é sangrar
Recentemente reuni e reli diversas obras sobre o processo de escrita para um projeto de pesquisa. Nisso me deparei com mais questionamentos do que respostas, sendo as respostas muito particulares, diversas, dependendo de cada autor, enquanto os questionamentos, estes universais, ecoam por quase todas as obras: por que escrevemos ficção? Para quê? De onde vem essa necessidade de por uma palavra depois da outra para criar histórias? De onde vêm essas histórias que criamos através da linguagem? Aliás, por que sempre estamos contando histórias? Mesmo que não fictícias nem escritas, quando conversamos com alguém, quando pensamos, até quando sonhamos, contamos histórias, simplesmente não conseguimos evitar. Talvez por sermos formados por narrativas: somos narrativas complexas, que se flexionam, se alteram a cada momento, a cada perspectiva, a cada ângulo e luz diferentes.
Acredito que, ao escrevermos ficção, na verdade não inventamos, mas organizamos de formas atrativas elementos que já nos habitam, e que talvez nós nem soubéssemos de sua existência até o momento da escrita, talvez ainda neste momento não compreendamos por completo o seu significado em nós, mas venhamos a compreendê-lo com o tempo, após relermos a nós mesmos. Escrever também é uma maneira de conversar com o nosso futuro eu, de escrever cartas para o futuro, sejam elas sobre o que acreditamos ser real em nossas vidas ou não, pois a ficção é uma parte de quem nós somos também.
A necessidade de criar vem da ânsia por explodir metaforicamente (ou não), de ser mais do que um esqueleto coberto de carne, mas um deus criador de universos, um poeta mergulhado em versos, de ser o inverso de si, de ser versos, palavras, símbolos, sons e significados, uma ânsia de adentrar o inconsciente usando letras e vírgulas como lanternas para explorar o breu do interior do próprio coração; uma ânsia de ser, de sentir não através da pele, mas através das letras que se derramam, pulsando, escorrendo pelas veias, desde a mente, desde o coração que as bombeia até os dedos e até o papel ou a tela. Escrever é uma forma de sangrar sem deixar cicatrizes visíveis, é uma forma de causar em si mesmo uma hemorragia sem morrer, é uma forma de respirar mais claramente, sem se perder demais na neblina que às vezes se torna a vida.
Amanda Leonardi |
Amanda Leonardi é Mestre em Letras pela UFRGS e escreve ficção. Já publicou contos e poemas em diversas antologias nacionais, colabora com os sites Nota Terapia e Artrianon e mantém a página @esqueletras onde posta microcontos de terror, resenhas e curiosidades literárias.
Para conhecer um pouco mais sobre a Amanda, escute o episódio do podcast Coletive Som gravado com ela clicando aqui.
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2 Comentários
Amanda, Amanda... Isso é coisa que se faça? Entregou quase o jogo todo. Senti-me desnudado até ficar só de tanga. Só faltou dizer que... ... Bah!
ResponderExcluirMas é por aí. É assim. Poder, criação, invenção, oráculo!
Já senti-me instrumento ao digitar coisas 'nao sei de onde'.
G. G. Carsan Oficial. Casa comigo no Instagram para trocarmos ideias.
Salve , Jorge. Ela é fantástica.
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