
Como sobreviver no Inferno

A obra é um marco do jornalismo em quadrinhos. Ao ler, a primeira coisa que me impacta é a crueza e a honestidade com que Sacco retrata o cotidiano nos territórios palestinos (Cisjordânia e Gaza) no início dos anos 90. Não é uma HQ sobre grandes batalhas, mas sim sobre a dignidade humana sob ocupação.

Sacco não se esconde; ele está lá, vulnerável, registrando desde a hospitalidade calorosa que recebeu até a frustração e a raiva das pessoas com a burocracia militar e a restrição de movimentos. A arte em preto e branco, caótica e detalhada, força você a ver o lixo, as pessoas apressadas, a vida acontecendo apesar de tudo. É um retrato visceral que humaniza as estatísticas.
Sacco documentou um momento específico, mas a obra ressoa profundamente com o conflito atual, pois toca em feridas históricas que persistem. A principal semelhança é o custo humano da disputa territorial e política. Assim como em 1992, a obra atual é marcada por sofrimento civil intenso, deslocamento e a luta pela sobrevivência. A diferença crucial é o contexto temporal: Palestina foca na vida sob ocupação daquela época, enquanto a guerra atual envolve dinâmicas de violência e retaliação muito mais intensas e recentes. O que permanece constante, e que Sacco capturou tão bem, é a tragédia de civis presos em um ciclo de conflito de décadas.

O livro nos lembra que, por trás de manchetes e números, há histórias individuais de dor e resistência, algo que a reportagem atual também tenta capturar, embora em um cenário de violência drasticamente escalado.



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