TECITURA

 


Daniel Pennac - Os dez direitos do leitor

Capítulo IV - Os dez direitos do leitor ou Os direitos imprescritíveis do leitor - faz parte do livro Como um romance, do pedagogo francês Daniel Pennac. Considerado um ensaio-romanesco ou um romance-ensaístico, fala sobre o processo de início à leitura com o espírito crítico esperado em um ensaio e a dinâmica própria de um romance, configurando leitura obrigatória para quem trabalha com o incentivo à leitura, apontando os erros cometidos por pais e educadores na tentativa de fomentar o hábito de ler entre os jovens, gerando o efeito contrário na maior parte dos casos: afastamento em vez de atração. Neste livro, Pennac relata sua experiência exitosa levando em consideração os tempos diferentes de cada pessoa e suas distinções, como as obras interagem com o indivíduo, processos necessários para que os jovens possam despertar para a leitura.

Este trabalho de Daniel Pennac de certa forma lembra-me Vygotsky - psicólogo e pensador da educação. Pennac busca em sua obra aquilo que Vygotsky chama de internalização do pensamento e do conhecimento. São processos, métodos que mostram-se eficientes, ferramentas úteis àqueles que pensam a educação e as metodologias utilizadas, bem como na elaboração de políticas de formação de leitores. Vamos aos direitos:

1 - O direito de não ler;
2 - O direito de pular páginas;
3 - O direito de não terminar um livro;
4 - O direito de reler;
5 - O direito de ler qualquer coisa;
6 - O direito ao bovarismo (doença textualmente transmissível);
7 - O direito de ler em qualquer lugar;
8 - O direito de ler uma frase aqui e outra ali;
9 - O direito de ler em voz alta;
10 - O direito de calar.

Os dez direitos do leitor, Daniel Pennac. Um trabalho interessante! Importantes reflexões promovem sobre os hábitos da leitura, sua importância como o enriquecimento do vocabulário, percepções acerca dos ambientes, contexto histórico, pensamento crítico. Ler só faz bem! Porém, para internalizar e efetivamente aproveitar as leituras, estas precisam ser prazerosas, pois somente desta forma tornam-se hábitos, ao ponto que que os leitores não consigam mais ficar sem ler, de forma ampla, eclética e sem preconceitos. Acredito que me encaixo em todos os direitos elencados; sobre as “releituras” - gosto muito de Machado de Assis, e creio ter sido o escritor por mim mais estudado no meio acadêmico. Antes de fazer minha graduação, fiz três cursos pré-vestibulares, pois
minha intenção era fazer Engenharia Elétrica na UFRGS e UERGS, isso lá nos anos 1990. Eram e são universidades concorridas! Acabei não fazendo os vestibulares naquela época, pois minhas viagens a trabalho sempre colidiram com as datas destes certames. O fato é que dois destes pré-vestibulares, semi-intensivos (utilizei-os bem quando comecei a fazer concursos, mais de uma década após), tive o mesmo professor de Língua Portuguesa e Literatura ao qual não recordo o nome, mas que era especialista em Machado de Assis (que estranho esta questão com professores/as, não? Alguns você mal recorda o nome, mas não esquece os ensinamentos! Ao menos comigo é assim). As falas deste professor nunca saíram de minha memória, tal a paixão que ele demonstrava ao mediar os conhecimentos em Literatura Brasileira. E Machado de Assis! Discorria maravilhosamente! Falava com orgulho de que ele (este professor) havia dado palestras em universidades da Inglaterra e França sobre a Literatura Brasileira e sobre Machado de Assis, que era o escritor brasileiro mais estudado mundo afora. E dava aos seus alunos um conselho: leiam Machado de Assis. E releiam! A cada cinco anos de suas vidas, façam uma releitura de alguma obra de Machado de Assis. Seja Quincas Borba, seja Memória Póstumas de Brás Cubas. A cada período, vocês, leitores, terão uma nova experiência, uma nova perspectiva, um novo olhar sobre o livro. A interpretação será diferente. A razão disso? Nossas mudanças, nossa evolução. As experiências adquiridas internalizam, não somos a mesma pessoa de cinco, dez anos passados; alguns pontos de vista mudam, e isso reflete na maneira como percebemos o mundo; as obras de Machado de Assis permitem isso, um espelho, um reflexo de nós. Machado de Assis, genial! O direito de reler é isso. Um exercício de autoconhecimento, uma prática de interpretação, reflexão e internalização. Por este direito, esta obra de Pennac, para mim, já serviria a seu propósito.

Acredito que não há uma fórmula pronta, idade adequada ou perfil para que qualquer um de nós tornem-se ávidos leitores. Basta a curiosidade, o combustível que impulsiona a humanidade a fazer coisas incríveis. Por quê ler algo somente por estar na moda? Qual a razão em terminar um livro ao qual você, leitor ou leitora, tenha achado ruim ou não lhe tenha agradado? Por qual motivo você precisa debater sobre temas ou assuntos, livros, revistas? Pode-se dar ao luxo de guardar sua opinião somente para si. Ler pode ser em qualquer lugar, em qualquer horário. Basta disposição! Boas leituras não requerem textos extensos. Você pode encontrar palavras que fixam na sua memória e lhe acompanhem por toda uma vida em uma mensagem curta, uma frase apenas. É o direito de ler qualquer coisa!

Gosto de textos curtos. A escrita literária oferece obras maravilhosas, romances épicos e temas complexos. Mas nem sempre temos o tempo necessário para dedicar a estas leituras, devido à correria que o mundo moderno nos impõe. Porém, leituras rasas, sinopses e resumos feitos por outras pessoas tiram a personalidade de nossa interpretação; talvez em função disso eu prefira as crônicas, os poemas e os artigos. Trazem à luz do conhecimento temas complexos, promovem reflexões, dialogam com o leitor de forma íntima e pessoal, sem que necessariamente seja preciso ler um livro inteiro para ter essas percepções. Pode-se ler algumas crônicas importantes de um livro que estas não definirão o todo daquela obra, mas tem seu caráter individual, independentes dos textos que as precedem ou sucedem. O mesmo se dá com os poemas, contos, mini-contos, artigos.

Conheço inúmeros perfis de leitores pelo fato de eu ter trabalhado em Biblioteca Pública. Os leitores contumazes, aqueles que buscam as sagas .... O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo, é um belíssimo exemplo; sete livros e demais obras oriundas deste universo. A Casa das Sete Mulheres, de Letícia Wierzchowski, todas as obras de Stephen King, os Best Sellers de Nora Roberts, Nicholas Sparks, Sidney Sheldon, livros de literatura espírita ... há toda uma gama de leitores, diversos perfis que gostam de ler, adquiriram ou cresceram com este hábito. Quem lê melhor que quem? Aqui entra um dos direitos ... O direito de ler qualquer coisa. Não importa! O importante é que leiam!

Minha filha lê muito. Nunca impus tampouco influenciei seus hábitos. Volta e meia pergunta-me sobre algum livro ao qual ela tenha interesse mas não faz parte de seu perfil de leitora. Exemplifico Jane Austen. Certa feita, estávamos em um consultório médico, aguardando para sermos chamados. Ela iria consultar, mas como era “menor”, levei-a. Na sala de espera, perguntou-me sobre Jane Austen; discorri sobre a obra de Jane Austen e sobre Orgulho e Preconceito, o trabalho que mais me agrada dela. Algumas amigas da minha filha (ela faz parte de uma pequena confraria de ávidas leitoras) fizeram a leitura das obras de Jane Austen ... e gostaram! Juliana acabou adquirindo um exemplar, muito bonito, de capa dura, belo para expor em uma estante ... mas não gostou! Não da história em si, mas a linguagem, os lugares, as pessoas, os costumes. Os livros não são bons ou ruins, são estilos diferentes. Os jovens dificilmente gostam dos clássicos pois não os entendem. Estas leituras, se não compreendidas, como qualquer outra, melhor não forçar pois acabamos por afastar potenciais leitores, e não atrair, cenário muito comum no ambiente escolar. Quanto a Juliana, conversamos após ela ler Jane Austen, ao que dissertei sobre a questão de ler clássicos; eu adoro os clássicos, faço a criação dos cenários em minha mente, os personagens ... temos que ter em mente que geralmente um clássico representa uma outra época, contexto histórico e linguagem de outros períodos, variáveis linguísticas, culturais, costumes ... representam registros históricos de tempos passados. Recentemente ela adquiriu 1984, de George Orwell. Ela ainda não fez a leitura, estou curioso!

Os dez direitos imprescritíveis do leitor ou Os dez direitos do leitor, trecho do livro COMO UM ROMANCE de Daniel Pennac, foi a obra escolhida para inaugurar o projeto Compartilendo, em 9 de novembro de 2021. Após um período sem encontros presenciais devido ao advento da pandemia Covid-19, a Biblioteca Pública Municipal de Gravataí oferece uma retomada com este formato, grupos de leituras através do Compartilendo, onde o foco está no debate e interação, troca de experiências entre os convidados (todos que quiserem participar), com textos, temas e mediadores/as escolhidos nos encontros. Ótima escolha para este reinício de atividades! Sucesso à Biblioteca Monteiro Lobato, de Gravataí! Por mais grupos de leitura, por cada vez mais leitores! Não importa o seu gosto literário .... o importante é que você leia!


Sandro Ferreira GomesProfessor de Língua Portuguesa, Conselheiro Municipal de Políticas Culturais em Gravataí/RS, Servidor Público, Porto Alegrense, admirador das belas artes, do texto bem escrito e das variedades de pensamento.







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