TECITURA

Feliz Ano Velho

Feliz Ano Velho! Não, não se trata do livro de Marcelo Rubens Paiva - excelente, devo dizer - lançado em 1982, um livro autobiográfico que trata principalmente de superação, força de vontade para se inserir na sociedade após um evento traumático e aspectos psicológicos enfrentados, preconceito, segregação. Poderia fazer um texto somente para este livro, merece reflexões e releituras, é uma obra ímpar! Pois então, lembrei dele para tecer a primeira Tecitura de 2022. É minha inspiração!

Celebramos a passagem do Ano sempre com as esperanças renovadas … novas conquistas, tudo aquilo não alcançado nos anos passados possuem potencial para se materializar nos anos vindouros. Ano Novo. Calendário! Uma das melhores invenções humanas, não? Deixar para trás as coisas ruins, negativas, alimentar nossas mentes somente com esperanças de melhoras …. a contagem do tempo em dias, meses e anos foi um avanço tecnológico marcante, trazendo consigo as Celebrações de Ano Novo e com ela, a Esperança, uma das marcas da Cultura Humana. Longe de mim traçar um caminho pessimista neste contexto. Sou um Otimista! Para mim, todo dia é Ano Novo … cada dia de vida representa um algo a mais, uma vitória pessoal, a certeza de que coisas novas virão … mas esta é a visão de um cara que sobreviveu a um mal súbito, que a pouco mais de dez anos rezou por mais algum tempo de vida, o suficiente para terminar de ver sua filha crescer, de fazer mais alguma coisa em sua vida. Talvez assunto para uma outra crônica! Ou um Conto … quero me aprofundar mais nos contos …

2021 foi um ano para celebrar. Vencemos! Estamos passando por grandes provações. Nossas sociedades estavam, em tempos recentes antes da Pandemia Covid 19, sofrendo deterioração. Os valores estavam muito modificados. Empatia em falta, famílias esfaceladas, irmãos brigados, casais separados por futilidades, filhos jogados à própria sorte. E veio esta Pandemia Covid19. Difícil pensar em algo positivo dentro de uma situação tão nefasta. O mundo inteiro mergulhado na mesma preocupação, engajado por um propósito comum, que é combater o avanço desta Pandemia; a guerra que todos tinham medo se apresentou como uma Guerra Sanitária! Tecnologias e metodologia científica foram nossas armas, e nosso maior inimigo veio do próprio homem, o Negacionismo! Enfrentamos batalhas semelhantes outras vezes, na história da humanidade, mas nunca antes a Ciência esteve tão avançada. E mesmo assim, a Ciência foi duramente atacada e criticada. É difícil explicar tal contexto. Por fim, a verdade e o método científico sobressaíram às crendices e ignorâncias. Celebremos! Foi uma vitória da Humanidade, uma vitória da Ciência!

Aos poucos, estamos retornando ao normal. Mas o que seria Normal? Em 2010 eu passei por uma experiência que redefiniu meu mundo, minha maneira de pensar e agir. Era uma pessoa capitalista, visava o lucro, era profissional de empresa multinacional e trabalhava muito! Nada contra isso, tal comportamento não tem nada de errado. O que digo é que nas coisas simples, o fazer cotidiano já passavam despercebidos por mim; vivia para o meu trabalho, e neste contexto perdia eventos importantes, pois estava sempre de plantão, vivia de horas extras. Assim foram alguns aniversários de minha filha e eu longe de casa, confraternizações de Natal, Ano Novo, interações com a família e amigos aos quais eu tinha que me retirar para atender algum chamado urgente … houve uma época em que eu saía pela manhã e minha filha estava dormindo, chegava à noite em casa e ela estava dormindo. Dinheiro não era problema naquela época, toda semana minha conta bancária era abastecida … mas eu estava perdendo o essencial. Aquilo que o dinheiro não compra: O Tempo. Quantos momentos perdidos! E meu recomeçar veio através de
um mal súbito … originado devido ao fato de estar negligenciando os cuidados com a saúde? Talvez, era uma viagem em cima da outra … trabalhando quatro dias em São Paulo, três dias no Rio Grande do Sul, assim eram as minhas semanas … e de repente tudo isso acabou! Assim, sem aviso, sem preparo … apenas fim!

E essa Pandemia, de certa forma, em escala global, não foi isso também? De certa forma, como Sociedades, não estávamos seguindo caminhos semelhantes? Não faço julgamentos referente às escolhas feitas … naquela época, aquelas eram as minhas escolhas, e o resultado veio. Não digo que foram ruins … foram necessários! Passei a ver o mundo sob outro prisma, passei a refletir sobre diversas questões e agi! Retornei aos estudos, refiz minha vida profissional, mudei de carreira … os ganhos financeiros não chegam perto daqueles que eu tinha naquele período, mas a qualidade de vida nem se compara. Repensei o capitalismo, pensei o que mais importa para mim … e descobri que O Tempo é o bem mais valioso. Aqueles momentos com a família, com minha filha, as confraternizações … cada dia é uma dádiva, onde eu agradeço os momentos simples, como curtir cuidar de minha cachorrinha, dar banho nela, dar amor a um serzinho da natureza que foi colocado neste plano para ajudar em nossa passagem; ir ao cinema com minha filha, cozinhar, ir para o trabalho. Cada dia é uma redenção, é uma energia nova, é uma nova esperança. O normal para mim nunca mais foi como antes desde aquele dia em abril de 2010. Percebi a beleza da vida e as múltiplas possibilidades que
cada um de nós tem em nosso entorno.

Refleti muito sobre isso neste ano de 2021. Não estávamos passando por algo semelhante como sociedades? O que é hoje o normal? Não seria um Novo Normal? Já não seria hora de repensarmos nossas atitudes … trabalhar mais a Empatia, um exercício de se colocar no lugar do próximo? Refletir sobre nossas escolhas e os caminhos que decidimos trilhar, se realmente é isso que queremos para nós? E o mais importante, pesar o valor das coisas e pessoas. Aqueles momentos protelados, não seria hora de revê-los? Talvez um tempo a mais com a família e com amigos valha mais que uma conta recheada. Eu escrevi um texto sobre
capitalismo … um estudo mais sério e aprofundado sobre ele vale a pena, pois o sistema não precisa ser tão perverso, cobrar tanto de muitos … não confunda esta colocação, não estou defendendo o Comunismo!

Eu aprendi a apreciar todas as formas de Arte e Cultura … hoje, minha vida profissional gira em torno das Artes e da Cultura. É encantador! Aprecie boas leituras … uma ilustração bem feita, trabalhos artísticos bem desenvolvidos, a cultura em que você está inserido. Não diga “Ah, a cultura não serve pra nada” como eu li de algumas pessoas neste ano que passou. A Cultura é tudo, amigos e amigas! Somos seres culturais, sem Cultura não somos nada! A Cultura e todas as suas formas de expressão estão aí, em nosso dia a dia … quando você liga uma rádio e escuta uma música, está consumindo Cultura, quando você lê uma matéria de jornal, assiste a um série ou a um filme, admira um quadro, um coral de igreja, uma banda tocar, um slogan qualquer, você está apreciando, consumindo e observando Cultura. Cultura é o que nos cerca, é nosso ambiente, é o que nos faz Humanidade. E Poesia. Poesia também. Há Poesia em tudo!

Então … Feliz Ano Velho! Somos vencedores! Chegamos até aqui. Que a boa luta tenha início, e que façamos deste 2022 um ano memorável!

 
Sandro Gomes

Sandro Ferreira GomesProfessor de Língua Portuguesa, Conselheiro Municipal de Políticas Culturais em Gravataí/RS, Servidor Público, Porto Alegrense, admirador das belas artes, do texto bem escrito e das variedades de pensamento.


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espalhe cultura!


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2 Comentários

  1. Superlativo, amigo.
    O que um mal maldito pode fazer?
    Tornar um capitalista em ser cultural.
    Realmente, o dinheiro é algo que torna homens livres em escravos. E sufoca, pisa e esmaga.

    G. G. Carsan.

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  2. O dinheiro é necessário para prover o mínimo conforto, mas não devemos nos tornar reféns dele! Abraços, meu amigo!

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