DANIEL FILÓSOFO

 A vida como ela é

A vida é uma caixinha de surpresas. É uma expressão batida e usada muito no futebol, mas pode-se usar no cotidiano. Para o bem e para o mal, tudo pode acontecer.

Inezita é um exemplo disso. Nascida em Buenos Aires, é daquelas argentinas bem dramáticas ao som do mais belo tango de Piazzolla. Mãe de cinco filhos, Inezita é daquelas mãezonas bem protetoras e que tem os filhos como a coisa mais importante do mundo.

Dos cincos filhos, o caçula é o mais “porra louca”. Não no sentido marginal da palavra. Dieguito sem encaixa mais na velha máxima: "seja marginal, seja herói".

Diego tinha 21 anos no auge da ditadura na Argentina. Revolucionário e bem combativo, lutou junto com outros jovens estudantes, pela liberdade da nação e o fim do sofrimento imposto pelo governo através da sua cruel ditadura. Apesar de a família ter consciência politica e saber que era uma causa justa, seus pais e irmãos mais velhos, tinham medo do que poderia ocorrer.

Infelizmente o que se temia na família ocorreu. Os milicos capturaram Diego e o torturaram até não poder mais. Por alguma sorte, divindade ou que seja, o jovem não morreu. Assim como outros torturados, Diego foi mandado para bem longe. Era melhor ter fora da alçada. O jovem foi ser exilar no Rio de Janeiro. Como era artista plástico, a cidade era propicia ao seu trabalho e podia desenvolver a sua arte.

Diego ficou incomunicável no pais vizinho e sua família sem saber o que houve com o rebento. Sua mãe juntou-se as Mães da Praça de Maio, em frente a Casa Rosada, por anos a fio, sempre com um cartaz com a foto do filho caçula. Com o fim da ditadura, a esperança de alguma boa noticia, continuava ao lado de uma angústia e desesperança.

Em terras cariocas, Diego estava com o trabalho consolidado, fazendo o que gosta, casado com uma brasileira e já com um filho. Com enormes saudades da terra natal, mas por causa dos traumas do passado, tinha medo de voltar a Buenos Aires ou mandar noticias.

Mas a vida tem suas nuances. Por ironia do destino, Dona Inezita, já idosa, quis ir conhecer a cidade maravilhosa. Tomar um banho de mar em Copacabana e pedir a benção ao Cristo Redentor. Só foi ela e o marido. Os outros filhos por motivos de trabalho, não puderam acompanhar. 

Assim que desembarcou no aeroporto internacional, sentiu uma sensação diferente. Pegou um táxi e foi direto ao um pequeno hotel na Lapa. Depois de um dia de descanso, foi curtir a noite, lá mesmo na Lapa. Assistiu a uma boa peça de teatro pelas redondezas, foi bebericar algo e curtir um bom som. Mas a vida tem suas surpresas. Já depois de ter bebido e comido bem, escutou uma voz bem familiar, vindo de outra mesa. Não queria ter a ilusão de ser seu eterno caçula, que estava à procura  e que não obtinha noticias por anos. Levantou-se, foi andando bem devagar e chegando perto, passou um filme na sua mente e tomada de emoção, viu o que esperava ha tempos: seu Diego, seu caçula, estava em outra mesa com sua família, que ela não tinha tido a honra de conhecer e nem imaginar que ele havia constituído.

Quando os olhares se cruzaram, Inezita já estava debulhada em lágrimas e de braços abertos que nem o Redentor. Como criança, Diego largou tudo e foi correndo aos braços de sua mãe e chorava um choro de soluçar. Era enfim, o passado sendo enterrado e todos podendo ficar em paz. 


Daniel Filósofo

Daniel Filósofo é cronista, jornalista, profundo conhecedor de rock'n'roll, torcedor do Fluminense e radialista. Também escreve a coluna "A música segundo o Filósofo".


"Quanto mais arte, menos violência. Quanto mais arte, mais consciência, menos ignorância."
- Ricardo Mendes

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5 Comentários

  1. Oi, sou a Isab-El. E me fizeste chorar. Belo texto.

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  2. Respostas
    1. Muito obrigado pelo retorno.
      Fico muito feliz por ter gostado

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  3. Excelente !!! Muito bom ! Sensacional!!

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  4. Fico muito feliz com isso e com a sensação de dever cumprido

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