PEIXE: A PASSAGEM PARA O PARAÍSO
Nasci numa família eclética, tínhamos várias religiões dentro de uma mesma família. Por isso eu tive a sorte de conhecer vários caminhos e optar pelo que eu mais me identificava.
A matriarca, Dona Conceição, pessoa muito espiritualizada. Espírita por opção, mas pregava muitas doutrinas da igreja católica, além de ser ótima benzedeira e cartomante. Foi ela quem me ensinou que não escolhemos religião, que é a religião que nos escolhe.
Desde pequena sou questionadora. Principalmente com as passagens da Bíblia. Quando fiz a Primeira Comunhão dei muito trabalho ao Padre Cândido Lorenzatto e as freiras da Igreja São Pedro, em Porto Alegre. Mesmo antes desta data eu já dava trabalho ao Padre Miguel Ollé Rovira, padre amigo da família que nos visitava frequentemente. Esse mesmo padre batizou, deu a Primeira Comunhão e casou minha mãe. Fui batizada e casada por ele e ainda batizou meus dois filhos. Ele enlouquecia com minhas perguntas. Quando me contava passagens da Bíblia eu fazia indagações desconcertantes.
Desde muito cedo a história do Papai-Noel, Coelhinho e Cegonha foi descartada, graças a Deus. Lembro que eu era muito pequena quando perguntei se coelho botava ovo, deixando meu tio Neri sem saber o que dizer.
A sexta-feira santa sempre foi um mistério muito grande para mim. Por que os Santos Cravos, os pregos que prenderam Jesus Cristo na cruz, não rasgaram pele e tendões? Com o peso do corpo ele não teria caído? Como os tendões de Jesus resistiram seis horas pendurado?
Por que a data da morte de Jesus Cristo varia de ano para ano? De acordo com o Google, a data da sexta-feira santa é calculada de acordo com alguns fatores: “A Sexta-feira Santa é a sexta-feira que antecede o Domingo de Páscoa, a data da Páscoa é calculada com base na primeira lua cheia que ocorre após o equinócio da primavera no hemisfério norte, a partir da data da Páscoa, a Semana Santa é definida, começando sete dias antes.” E isso causava uma confusão na cabecinha de uma criança autista que primava pela lógica.
Minha avó também não nos deixava brincar com nenhum jogo. Minha tia Neide e eu brincávamos muito com jogos de tabuleiro e naquele dia era proibido porque os soldados fizeram apostas pelo manto de Jesus. E eu me perguntava: - E o que isso tem a ver comigo? Também não podíamos usar agulhas, facas, nada pontudo. Nem crochê minha avó fazia. Aliás nem pentear os cabelos era permitido. Era muita regra sem lógica, pelo menos para mim. O bom era que minha mãe não podia bater em mim neste dia... mas no sábado ela “tirava minha aleluia”, como dizia.
O cardápio também não fazia muito sentido. Aliás, para mim até hoje não faz. Hoje, procurando alguma lógica na internet , me deparei com coisas que ratificam meu pensamento. Por que não posso comer carne? No site www.educação.uol.com.br muitas informações interessantes:
“A abstinência de carne é uma questão de praticar a caridade, segundo os padres consultados. A carne sempre foi um alimento caro e, por meio da abstinência, a pessoa era levada a ajudar outras pessoas. A privação de carnes deve vir aliada à reflexão e não apenas restringir o cardápio. A igreja orienta em relação ao jejum e abstinência, mas também a colocar em prática a caridade, a oração e um pouco mais de silêncio e recolhimento, contendo um pouco a euforia. O padre e professor do departamento de Teologia da PUC-RJ, Anderson Batista Monteiro, alerta que a Sexta-Feira Santa não é um dia para comer peixes nobres, mas sim para relembrar e refletir espiritualmente.’ ‘É um dia para que o corpo reze. Enquanto padre, sempre recordo que não é o dia da peixada. É dia de comer pouco.”
Vejo a Sexta-feira santa como uma festa regada a bacalhau, camarão, salmão fugindo totalmente da verdadeira razão da abstinência da carne e não vejo muita gente praticando caridade. Então não estamos seguindo o que está escrito na Bíblia?
De acordo com o que se ouve por aí a pessoa pode cometer vários pecados, mas se comer peixe na sexta-feira santa será perdoada? Ainda neste pensamento uma pessoa poderá “ir para o inferno” só porque comeu carne nesta data?
Nas sextas-feiras santas eu sempre vou a um restaurante especializado em frutos do mar, mas não por doutrina religiosa e sim porque é o único dia do ano que encontro vários produtos do mar a minha disposição em um único lugar. Na saída sempre levo uma quentinha para oferecer a uma pessoa em situação de rua que encontrar pelo caminho, sirvo a mesma qualidade de comida que eu comi. Para mim isso é a caridade que a Sexta-Feira Santa orienta.
Então, meu amigo, minha amiga, podes comer o que tu quiseres, até carne, ou o que o teu bolso permitir. Depois de mentir, trair, enganar, roubar... não será um simples peixinho que te levará ao paraíso.
![]() |
Isab-El Cristina |
A ALMA E O ESPÍRITO!
2 Comentários
Sempre maravilhosa e com a navalha afiada! Parabéns!
ResponderExcluirOi, sou a Isab. Obrigada, Tânia. Bju
Excluir