DOSSIÊ KOBIELSKI

MUITO ALÉM DOS SUPER-HERÓIS  - 2

Dell/Gold Key



No início dos anos de 1960 a Dell Comics era a editora que mais vendia gibis no mundo. A parceria da Dell - que editava e distribuía - com a Western – que produzia esses quadrinhos -, resultou no que era, em sua época, a editora mais bem-sucedida do ramo dos comics. Em um período em que não havia absolutamente nenhum mercado especulador - ninguém comprava mais de um gibi por semana; ninguém comprava para fins de investimento - eles tinham muitos títulos sendo vendidos rotineiramente na casa dos milhões nas bancas de revistas. Os gibis eram muito populares nessa época, e a distribuição da Dell era a mais eficiente de toda a história dos quadrinhos. Mas, uma decisão estratégica equivocada levou a poderosa Dell para caminhos desastrosos e adversos. No ano de 1961, ela ainda era a primeira em vendas, mas em função dessas altas vendas e, sempre em busca do elemento principal do sistema capitalista, o lucro, decidiu aumentar o preço de suas revistas de 10 para 15 centavos de dólar. Foi um golpe fatal para a poderosa Dell, um golpe do qual a editora não conseguiu se recobrar. As outras editoras ainda mantiveram o preço de 10 centavos durante vários meses, para depois aumentá-lo para 12 centavos. Com isso, a Dell, em 1962, sofreu uma queda muito grande na venda de suas revista, perdendo uma parte preciosa do mercado. A revista “Walt Disney’s Comics & Stories”, por exemplo, vendia perto de dois milhões de exemplares por mês em 1960. Com o aumento do preço, caiu para um milhão em fins de 1961 e para meio milhão em 1962. Isso causou um grande abalo e inquietação dentro da Dell Comics em 1961. A diretoria, achando que estava gastando muito para pagar os direitos dos títulos licenciados, resolveu cortar muitos deles e produzir dentro da própria Dell suas próximas revistas. A Western não gostou dessa nova política editorial da Dell. Ou melhor, não aceitou. Decidiu então não produzir mais nada para a Dell, e ela mesma, a Western, publicar seu material.  




A partir desse momento, surgiu então, em 1962, uma editora cuja produção se diferenciava bastante daquela da fase anterior. Ela continuou com suas quadrinizações de filmes e personagens baseados em séries de TV, como “Get Smart, “Dr, Kildare” e outros. Também desenvolveu diversos novos personagens, criação da casa, livres de pagamento de direitos autorais como “Nukla”, ‘Melvin Monster”, ‘Brain Boy”. Tudo muito inexpressivo. A Dell não sabia fazer comics como a Weastern. Conseguiu sobreviver a década de 1960, mas no final já estava cambaleando e sem forças. Entrou os anos 1970 totalmente debilitada. Morreu em fins de 1973. Não a editora Dell. Esta continuou suas atividades com livros diversos. Quem despareceu foi a Dell Comics, que encerrou seu longo envolvimento com as revistas em quadrinhos após 37 anos e mais de 800 títulos diferentes publicados.
 




Mas se a Dell se enfraqueceu e faleceu, a Western se fortaleceu. Após seu rompimento com a Dell, a empresa começou a publicar seu material com o selo Gold Key. Ou seja, a Gold Key era a própria Western publicando suas próprias revistas. Estava tudo em casa. Muitos títulos publicados pela Gold Key era continuações daquele material que a Western fornecia para a Dell. As revista chegaram inclusive a continuar a numeração deixada pela Dell, outras voltaram ao número um.  

Dentro da linha infantil, a Gold Key continuou com todo o material da Disney, Hanna-Barbera, “Tom & Jerry”, “Bugs Bunny”, “Popeye”, “Litle Lulu” e outros. No gênero de aventura, “Tarzan”, “The Lone Ranger”, “Turok Son of Stone” também foram continuados.

Mantendo aquele mesmo sistema de licenciamento de séries de TV para os quadrinhos, a Gold Key continuou com alguns personagens que já produzia para a Dell e criou novos. Ela tinha que pagar direitos autorais desses personagens, mas por outro lado tinha, indiretamente, comerciais grátis na televisão. A simples exibição dessas séries na TV já funcionava como comerciais para as revistas da Gold Key. Eram nomes como “The Pink Panther”, “Bonanza”, “Gunsmoke”, “The Munsthers”, “Lost in Space”, “The Man From U.N.C.L.E.”, “The Twilight Zone”, “Daniel Boone”, “Star Trek”. Além das séries de TV, a Gold Key também continuou com a quadrinização de filmes.
 


     




A Gold Key desenvolveu também uma linha de personagens novos. A primeira revista a trazer o selo da Gold Key foi justamente uma de suas criações: “Doctor Solar” de Bob Fugitani. A segunda grande criação da Gold Key (talvez a melhor de todas) surgiu em fins de 1962, “Magnus The Robot Fighter” de Russ Manning. Depois vieram “Korak, Son Of Tarzan”, também de Russ Manning. Outro grande êxito da Golde Key foi a quadrinização dos livros de “Tarzan” de Edgar R. Burroughs feita por Russ Manning.

Os anos 1960 foram bons para a Gold Key. Em 1967, por exemplo, “Tarzan” e “The Man From U.N.C.L.E.” vendiam mais exemplares do que “Spider- Man”, o campeão de vendas da Marvel.  





Apesar das tentativas de manter a sua linha de revistas sempre florescendo, a Gold Key não terminou bem a década de 1970. A competição com a Marvel e a DC era insustentável. Os tempos haviam mudado e os super-heróis dominavam amplamente o mercado e o gosto dos leitores. A Gold Key começou ter dificuldades com a distribuição de suas revistas. Numa tentativa de reverter o quadro, resolveu vender seus gibis em sacolinhas plásticas, três em cada, visando lojas de departamentos e outros locais de venda, evitando aqueles tradicionais, onde DC e Marvel praticamente tomavam conta. Em 1981, a Gold Key mudou de nome para Whitman e continuou com o mesmo sistema. Mas os problemas de distribuição e vendas foram aumentando mais ainda. Em fins de 1984 tudo morreu. 

Não houve em todos esses anos de quadrinhos, nenhuma editora que tivesse produzido uma linha tão variada, tão incrivelmente diversificada, em gênero e personagens como a Dell e a Gold Key.  

Um importante detalhe que sempre distinguiu as revistas da Dell e Gold Key das demais publicações das outras editoras foram as capas, as suas belíssimas e inigualáveis capas. Nunca houve capas de gibis como aquela das Dell e da Gold Key. Quando se tratava de personagens de cinema ou TV, as revistas traziam na capa uma fotografia do ator, como Rex Allen, Gene Autry, Roy Rogers, Johnny Mack Brown, Clayton Moore (The Lone Ranger), Clint Walker (Cheyenne), Lex Barker e Gordon Scott (Tarzan), etc. Ou então aquelas maravilhosas ilustrações, verdadeiras pinturas artísticas, como as capas de “Tarzan”, “The Lone Ranger”, “Turok Son of Stone”, “The Cisco Kid”, “Lassie”, “Buck Jones”, “Tonto” e muitas outras, desenhadas por artistas do quilate de Hank Hartman e Ernest Nordli, especialistas nas pinturas do gênero western; Morris Gollub que fez muitas capas de “Tarzan”, “Lassie” e outras; George Wilson ilustrou capas para “The Phantom”, “Magnus”, “Turok” e outras. Jamais haverá nada igual àquelas capas 





Hoje, a Dell, a Gold Key e a Western são nomes raramente lembrados pelas novas gerações de leitores. Mas no passado foram gigantes imbatíveis dentro dos comics americanos. No Brasil, esse material foi publicado pela saudosa Ebal e também pela Abril, com toda linha Disney. Esses gibis eram muito populares entre nós, que juntávamos nossas parcas economias para irmos correndo até uma banca de revista em busca desses verdadeiros tesouros que nos encantam ainda hoje.  


A primeira e a última edição de Walt Disney’s Comics & Stories pela Dell/Gold Key/ Whitman, o fim de uma época maravilhosa:

 n°01 - 1940
                           n°510 - 1984



                   



Paulo Kobielski é professor de História com especialização em Filosofia e Sociologia pela UFRGS. Quer conhecer um pouco mais desta pessoa maravilhosa que é o professor Paulo Kobielski? Acesse o podcast Coletive Som - a voz da arte:

.A conversa de hoje acontece com um professor apaixonado por quadrinhos, fanzine e educação. Paulo Kobielski nos convida para conhecer melhor o que é o fanzine, e como ele e as HQs podem contribuir para a emancipação cultural e social de jovens e adultos. Também nos conta sobre o seu trabalho como produtor cultural na cidade de Alvorada, com o evento Gibifest, e em Porto Alegre, na Feira do Livro da cidade, com o Mutação na Feira, em parceria com o também fanzineiro Denílson Reis. Além disso, fala do seu processo de criação com o fanzine Mundo Gibi





Paulo Kobielski

                                                        


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