FISSURAS NA QUARTA PAREDE

OPINIÃO

  POR ONDE PASSA O SEU “PENSAR”

Recentemente terminei de ler um livro.

Algo que teria sido corriqueiro há alguns anos, mas de uns tempos pra cá tem se tornado exceção. Das promessas de Ano Novo, das quais poucas cumprimos, uma
delas foi uma hora de leitura por dia. Leitura de livro. Papel na mão, folheando páginas, sentindo o cheiro, saboreando. Livros inteiros, do início ao fim, ainda que sem fins... Literatura de fato! E penso, agora, na grandiosidade de possibilidades que esse termo pode abranger. O literário e suas simbologias que está para além, muito além, das leituras rápidas online que fazemos.


Dito isso, você deve estar se perguntando: “Ok, mas o que isso influencia na minha vida? No que as tuas experiências literárias (no caso minhas) têm a ver comigo (no caso você)?!”. Tudo! Ler boas obras, sistematicamente, gera um processo de
“abertura de mentes” que os mais crédulos diriam tratar-se de um milagre e os mais
modernos de uma distopia de mundo paralelo. Não, eu não estou brincando. É tão
louco esse processo que você passa a achar que não sabe mais nada (e você não
sabe mesmo), passa a duvidar de tudo e, pasmem, a questionar (logo você que foi
sempre ensinado a ouvir, aceitar e executar). E com isso, tudo o que parecia verdade
e que dizem ser verdade, passa a não ser tão verdade assim. Entendeu?!


Calma, não para por aí! Você passa a formular suas próprias conclusões, desmembrar pensamentos, identificar ações, construir associações, a problematizar o que sempre foi lhe dado de forma mastigada... E você, sempre tão esperto, logo, identifica que a ignorância não gera dúvida. Passa, de fato, a pensar sozinho e não mais a reproduzir o que queriam que você pensasse.

Somos, desde a infância, submetidos a instâncias de poder que nos determinam o que é “certo” e “errado”. Primeiro em casa, com nossos pais, depois na escola, em ciclos de amizades, no trabalho, nos relacionamentos afetivos, na Igreja, na política e, mais recentemente, até nos grupos de WhatsApp. O poder individual de questionamentos e decisões sempre tão privados e tolhidos. Eu, que deveria ter o direito ao relativismo, que implica nas diferenças de percepções e considerações sobre determinado assunto, sou obrigado a aceitar a massificação de informações e verdades ditas absolutas, com validades inquestionáveis. Conceitos subjetivos não são bem aceitos em hierarquias de poder.

Relações horizontais passam pelo entendimento individual do seu “ser” “estar” no mundo em consonância e dissonância ao coletivo. Ideias, são um conjunto de opiniões sobre determinado assunto que precisam ser discutidas, dialogadas, questionadas, fundamentadas. E vamos combinar que “E-Books” de redes sociais não nos dão essa sustentação.

Agora, se você ainda não entendeu onde entra o livro e uma boa literatura (não me venha com fórmulas de “autoajuda” e “como enriquecer em 365 dias”) nessa história toda, realmente, você faz jus ao determinismo que está submetido. Mas calma, há sempre tempo! Ainda que possa parecer doloroso e perigoso aos olhos de alguns,
entender que o sentimento de liberdade não é uma ilusão subjetiva, contudo, está
diretamente atrelada a sua capacidade de pensar.





Izabel Cristina é Licenciada em Teatro, gestora de cultura e Especialista em Acessibilidade Cultural, atriz, dramaturga, diretora e professora de teatro. Desde 2014 coordena o Departamento de  Artes Cênicas da SMCEL- Secretaria Municipal de Cultura, Esporte e lazer de Gravataí/RS

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