INQUIETUDE
Dia destes fui convidado pela Coletive para mediar uma entrevista com o artista visual e fotógrafo Alex Glaser via Live no Instagram, em virtude da inauguração de sua exposição fotográfica chamada Inquietude.
Inquietude. Que interessante! Conversa fluída com Alex, um cara de posicionamento forte! Percepção apurada e conhecimento histórico (como é interessante conversar com alguém que conhece e dá valor à história nacional e mundial, e às histórias particulares de cada um!). Alex se diz um inquieto. Primordialmente um tímido. E um inquieto. E sua Inquietude o fez ser uma pessoa curiosa, e esta curiosidade o fez um crítico capaz sobre os aspectos sócio-político, culturais e históricos que nos rodeiam. E conhece história! Ao dissertar sobre assuntos atuais, Alex traça aspectos históricos remetendo aos tempos do império, remetendo a Getúlio Vargas, remetendo ao AI-5. E Alex conhece Marx! Não para trocar ideias superficiais, baseadas em conhecimentos superficiais, de “ter ouvido falar” ou de “ter lido alguma frase de Marx em algum lugar”. Não, Alex é uma rara figura que conhece profundamente a obra de Karl Marx! Há poucos, creiam! Pois se houvessem muitos, não se falaria tanta besteira sobre a obra de Marx. E Alex se diz um pessimista. Porém, o que Alex consegue capturar em suas fotografias em preto e branco (sim, ele fotografa em preto e branco, a ausência de cores em sua fotografia casa com a mensagem, é um elemento vivo, um personagem do contexto) é algo que não se traduz em palavras. Captura aquele momento em que a alma fala, os indivíduos emprestam seu olhar através da linguagem corporal, da expressão impressa nos olhos, aquela “coisa” só possível pelos olhos de um artista, a sensibilidade única que faz a diferença entre um artista que faz da fotografia a forma de expressar sua arte do olhar de um fotógrafo profissional.
Inquietude. Inquieto. Pessoas inquietas. Estava querendo escrever sobre esta palavra, sobre a entrevista, mas não estava pronto ainda. Demorei para “digerir” este conceito. Está além daquilo que os dicionários apresentam, da etimologia da palavra. Alex Glaser me ensinou muito! Acho que afinal compreendi a real dimensão da palavra. Começou vagarosamente a entrar em meus textos, a fazer parte de meu vocabulário. Uma palavra com este poder, internalizada em mim pelas percepções de um fotógrafo, alguém que trabalha com as imagens. Esta transversalidade de pensamentos é linda, não?
Então comecei a escrever crônicas. E escrevi sobre o grande campeão Aurélio Miguel. Um inquieto, antes de mais nada! Sua inquietude o fez ser quem é, um inquieto que não foge da luta, que enfrentou adversários formidáveis, dentro e fora dos tatames. Era isto que Alex quis dizer. É assim como ele enxerga Marx. É assim que se descreve. E comecei a associar. Assim passei a ver muitas pessoas que me cercam, que fazem parte de minha vida, os amigos que permeiam minha vida. Karen Suelen, Aline Daka, Lais R C são inquietas! Fazem da arte sua forma de ver a vida. Karen é dona de um traço magnífico, captura o espírito de uma pessoa através de sua visão, a beleza do olhar, dá vida a seus quadros. Aline Daka está lançando um trabalho maravilhoso, uma HQ experimental em que aborda temas controversos e reflexivos, o casamento perfeito do traço com a palavra. E Lais, que também é da arte e trabalha com o visual, está se aventurando no projeto Palhaçaria, criando uma personagem maravilhosa que vai levar muita alegria às pessoas, aos jovens. São umas inquietas!
Lembrei de Elenara Passos, a Lelê, e de Márcio Agliardi, amigos de longa data. Professores! Ela, Pedagoga, ele Professor de Matemática e Química. Acompanhei a trajetória deles, e a luta para que realizassem seus sonhos, que era a formação acadêmica. Foram minha fonte de inspiração quando decidi retornar aos estudos, e escolhi a educação como foco de formação, fazendo minha graduação em Letras. A curiosidade em desvendar a paixão que os movia pela profissão. Apesar de tantos e históricos ataques, eles sempre fortes no propósito de ensinar. Afinal, o que faz um professor trabalhar com tanto afinco, mesmo sob esta desvalorização histórica? Descobri. O professor, assim como o artista, é um personagem Inquieto!
Emir Rossoni. É um inquieto! Escritor premiado, suas crônicas serviram para mim como fonte de inspiração. Que fino trato das palavras! Que sensibilidade! E continua com o mesmo brilho no olhar de quando eu o conheci, a vinte e tantos anos atrás. Sua Inquietude sempre foi, ou nasceu após ele aprender a caçar vagalumes?
Adriana Emerim, servidora concursada, estabilidade garantida. Mas não! Sua Inquietude não a deixa parar! Sua inquietude a faz vibrar frente a novos desafios. E
assim a UFRGS ganhou uma grande mestre, e Gravataí perdeu sua Técnica Superior Literária.
E assim, posso passar horas dissertando sobre a Inquietude e sobre as pessoas. Esta palavra passou a fazer parte de mim, pois também me identifiquei! Alex está errado em um ponto. O conhecimento desta palavra traz esperança, renova o olhar, em mim renovou o otimismo!
Pois conheci uma história. Um destes meus amigos. Acompanhamo-nos nas redes sociais. Tem uma linda história, mas não gosta de falar dela. Talvez por receio de sofrer preconceito, pois estamos cercados por pessoas que alimentam preconceitos. E este amigo prefere o anonimato. Mas sua história não merece ficar anônima. Então, preservando seu nome, vou contar sua história. A história de um Inquieto, um cara que sofre de Inquietude.
Como explanei algumas vezes, sou servidor público em Gravataí- RS e trabalho na Biblioteca Pública Municipal, com minhas queridas colegas. Bruna e Cláudia são as
bibliotecárias, Jacira é nossa coordenadora, Iara faz comigo o atendimento. E atendemos ao público ... aos públicos! É bastante eclético. Público geral, público dos projetos sociais, crianças e adolescentes ... e pessoas em situação de vulnerabilidade social. Moradores de rua, frequentadores do Albergue Municipal e dos centros de atendimento assistencial da prefeitura. Estas pessoas são os “invisíveis” para a sociedade, estão à margem destas ditas sociedades, relegadas a um segundo plano, marginalizadas. Mas não para nós. Somos servidores, e o nome da profissão já diz o que somos e qual nossa função: servir! Talvez este trato faça com que este público sinta-se tão bem em meu ambiente de trabalho. Leem muito! Utilizam os espaços, o Telecentro, são pessoas bem informadas! E assim conheci Meu Amigo. A razão à qual o fez estar ali, em uma situação de vulnerabilidade social, só a ele pertence. As origens são diversas, cada biografia, uma história surpreendente. Este amigo era uma pessoa interessante. Começou timidamente a frequentar nossos espaços. E assim, passava seus dias. Pela manhã até o final de nosso expediente, algumas vezes sem almoçar, pegava livros e ficava direto. Chamou nossa atenção, e começamos a conversar com ele. Eu, Bruna, Adriana Emerim, nossa Técnica Superior Literária, que por vezes nos visitava; nossa coordenadora, enfim, toda a equipe. É um homem simpático. Um cara interessante! E de boa apresentação, as meninas da secretaria o achavam muito bonito. E passou a frequentar nosso projetos. Projetos abertos ao público, passou a frequentar o Leia Mulheres, em especial. A cultura o fez renascer! A cultura trouxe à tona aquele ser Inquieto de outrora! E assim começou a estudar. Foi um ano intenso, onde entrava pela manhã e saía ao fim do expediente. Tinha o ensino médio completo. E passou a estudar e a consumir arte e cultura! Direito administrativo e constitucional, administração, contabilidade, matemática e língua portuguesa se misturavam a Goethe, Hemingway, Neruda, Machado de Assis. Assim passava seu tempo, lendo, estudando, trocando ideias conosco, concurseiros que somos. E assim veio trazer-nos as notícias! Aquele ser, aquela pessoa que enfrentava uma situação de vulnerabilidade social, que, por algum motivo em sua história, tornara-se um morador de rua, frequentador dos albergues públicos municipais, passou entre os primeiros colocados em três concursos públicos!
Assumiu cargo em um órgão federal. Mas não por muito tempo. Cerca de sete meses depois de assumir este cargo, foi chamado em outro concurso melhor, cargo que envolve educação e assistência social. Este Inquieto hoje trabalha com jovens, um
orientador! Nada melhor e mais condizente para uma biografia como esta!
Alex, obrigado pela palavra. Seu trabalho casa perfeitamente com a concepção deste termo. Inquietude é uma palavra forte! Sejamos Inquietos! Aos desafios, aos recomeços, à resistência!
Sandro Ferreira Gomes, Professor de Língua Portuguesa, Conselheiro Municipal de Políticas Culturais em Gravataí/RS, Servidor Público, Porto Alegrense, admirador das belas artes, do texto bem escrito e das variedades de pensamento.
Sandro Gomes |
03 ANOS DE COLETIVEARTS
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2 Comentários
Que viva a inquietude e toda a sua sede de mudança e transformação de mundo. Adorei o texto e o ensaio fotográfico.
ResponderExcluirSejamos inquietos!
Sejamos Inquietos! Obrigado pelo comentário, bela artista Inquieta!
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