NAVALHAS AO VENTO

 

A ovelha negra que sonhava

 ser imortal

Hoje o dia amanheceu triste. O Jornal da Manhã já anunciava um “Caso sério”: um “disco voador” desceu a Terra e entre a “Erva venenosa” do planeta, encontrou um diamante, “Uma pessoa comum/ um filho de Deus” e o levou embora.

“Desculpe o auê”, mas a notícia doeu. A música perde Rita Lee... e o rock perde seu colorido cheio de “Volúpia”.

Foi ao som de Rita Lee que eu aprendi a ser “Ovelha negra”, a primeira vez que ouvi, chorei. A música bateu lá no fundo e “Um belo dia eu resolvi mudar/ e fazer tudo o que eu queria fazer”, passei a ser colorida, passei a não me importar... “E fui andando sem pensar em voltar/ e sem ligar pro que me aconteceu”. E isso não aconteceu apenas com aquela garota rebelde/ reprimida/ liberta, muitas garotas da minha geração espelharam-se na irreverente e transgressora dos cabelos vermelhos como brasa. Nas entrelinhas... e mesmo explicitamente, ela nos mostrou que não éramos “Nem luxo, nem lixo”, éramos garotas a procura, nunca a espera, do “Doce vampiro” para “amor e sexo”, porque o “Sexo frágil não foge a luta”.

Ah, Rita, muitas vezes eu ficava admirando a tua desenvoltura, tua afinidade com o palco, sem nenhuma vergonha de ser feliz em fazer o que gosta, toda colorida, roupas extravagantes... isso sempre foi rock e eu sou apaixonada por rock. “Esse tal de Roque Enrow”, principalmente cantado por mulheres, rompeu as amarras da minha geração. A geração da década de 70 pegou “Mania de você” ao entender que “Dondoca é uma espécie em extinção” e que “Nem toda brasileira é só bunda”... “Por isso não provoque/ é cor de rosa choque” 

Lembro da minha mãe censurando “Lança perfume”, eu não podia ouvir este disco porque, para ela, era imoral. E eu achava brilhante aquela mulher falando, sem medo nem falso pudor, de sexo e de prazer feminino, com aquele sorriso de “Deixa os acomodados que se incomodem”, deixa o mundo girar que é para movimentar, para fazer vento e dar direção as nossas vidas. Rita Lee é uma das pessoas que me inspirou, sim, a ser melhor... ou pior, depende do ângulo. E eu pouco me importo com a tua opinião, mas a garota tímida de ontem desapareceu, ela aprendeu a se posicionar. Hoje “Pra pedir silêncio, eu berro/ pra fazer barulho eu mesma faço” tendo a grata consciência de que “Bwana me salvou”, que sou a única responsável pela minha vida e por isso “ Não quero gorjeta/ faço tudo por amor”.

Está doendo perder tantos ídolos da minha juventude. Mas pouco a pouco todos irão embora. Isso me mostra que eu também estou velha e a sensação de finitude começa a bater na porta. Todos nós pegaremos a “nave espacial” e partiremos, só não sabemos que data está grafada no ticket de viagem... “E apesar dos pesares do mundo/ vou segurar essa barra”.

Mais uma perda importante na música brasileira e agora? “Agora só falta você” nos “Jardins da Babilônia”!

RITA LEE:



Isab-El Cristina Soares
Isab-El Cristina Soares é poeta, membro do Clube Literário de Gravataí, autora de 6 livros.  Graduada em Letras/ Literaturas, pós-graduada em Libras.

Escute o episódio do podcast Coletive Som gravado com Isab-El , clicando Aqui.


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