Gravataí: Fotografe Antes Que Acabe
Tal qual um marinheiro destemido diante das borrascas e despido das mortalhas do consumismo, deleitando-se com uma amante em cada porto, singro os setes mares da luxúria...
Assim planejei começar o texto de hoje, entretanto a vida nos chama ao compromisso de vivê-la ou morrer na alienação.
A morte, fim inevitável de todo aquele que vive, chegará a todos: ricos ou pobres, belos ou não tão belos, inteligentes ou “gado”, promíscuos ou virgens, todos chegaremos, inexoravelmente, ao mesmo fim... Entretanto (ah! felizmente sempre há um maravilhoso “entretanto”), não é o fim que importa, mas sim o que fazemos das nossas vidas até chegarmos lá...
A professora de História aposentada Marli Thomassim Medeiros, por exemplo, tornou-se conselheira da cultura de Gravataí, atuando na Setorial do Patrimônio e é proponente da exposição “Gravataí: Fotografe Antes Que Acabe”, que teve início no dia 6 e vai até o dia 28 de novembro, portanto, está quase acabando!!!
Contemplada com o primeiro lugar no 8° Prêmio Dana de 2024, a exposição “Gravataí: Fotografe Antes Que Acaba” está no Disco Voador da Cultura, oficialmente chamado de Quiosque da Cultura, de segunda à sexta, das 9 até às 17 horas, sem fechar ao meio-dia.
A parceria entre a empresa Dana Albarus e a Prefeitura de Gravataí, ao disponibilizar o espaço e os funcionários que atuam no Quiosque da Cultura, foi fundamental para a realização desta e de outras exposições realizadas ao longo dos oito anos do Prêmio Dana, demonstrando a imensa importância de tal premiação para incentivar atividades culturais no município. Se uma empresa consegue este resultado, imaginem se as outras dezenas de empresas instaladas na “Aldeia” fizessem a mesma coisa?! Que impulso a cultura teria em Gravataí, não é mesmo!?
Segundo a proponente, a professora Marli, “esta exposição é fruto da preocupação com as transformações aceleradas pelas quais passa a nossa cidade e o seu efeito sobre as memórias e a identidade dos seus moradores”.
Quem conheceu Gravataí na década de 1980, com o seu centro com aquele ar bucólico, algo assim como uma eterna tarde de domingo, onde as crianças brincavam nos balanços e escorregadores, os casais passeavam, os idosos, sentavam nos bancos da Praça de Cima, à sombra das árvores, jogando conversa fora (que é a melhor maneira de conversar); nas ruas havia vagas e mais vagas para estacionar sem medo de multas; as calçadas, com suas pedrinhas coloridas, testemunhas mudas de tantos e tantos passos dados pelos aldeões carregando suas alegrias, sonhos, tristezas e esperanças, nas andanças, passando na frente da Prefeitura ou esperando ônibus na Rodoviária; fica chocado com todas estas novas construções de ferro, concreto e vidro soterrando o verde das praças... Transformações nos espaços de convívio, destruição de locais que eram referências na cidade, tanto no seu aspecto da memória urbana quanto na própria localização das pessoas, não existem mais, foram destruídos ou drasticamente modificados, perdendo as suas características originais
Na vida as mudanças são inevitáveis, o mundo não é estático, os átomos se movimentam, tudo se transforma, entretanto é necessário refletirmos para onde estamos indo com estas mudanças. Ao entregarmos áreas públicas à inciativa privada, derrubando patrimônios afetivos dos gravataienses sem a devida discussão com a comunidade, estamos indo para onde?
A exposição “Gravataí: Fotografe Antes Que Acabe” é um ato político, um alerta sobre os rumos que o tal progresso privatista está nos levando. Vivemos, nestes últimos anos, um processo de “MacDonaldização” de Gravataí, transformando-a rapidamente em uma cidade igual a qualquer outra no ocidente, onde a concentração de riquezas nas mãos de poucos cria absurdos como uma Rua Coberta, que na verdade é uma Rua Privada porque tem horário para fechar e abrir, regras colocadas nas suas entradas (ou saídas, dependendo para onde se vai) de como frequentar aquele espaço, que por isto mesmo já não é mais público. Há relatos de pessoas que foram barradas e até mesmo expulsas da tal “Rua Coberta”, provando tratar-se de uma “Rua Privada”.
Ninguém é contra o progresso, apenas está se questionando o preço pago pelo dito progresso e quem se beneficia do mesmo.
NESTOR OURIQUE MEDEIROS |
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