Parte 5
No sonho ela era novamente a mesma garota ruiva, de longos cabelos e vestes antigas. Caminhava pela floresta carregando uma cesta cheia de ervas. Podia sentir o cheiro dos elementos que colhera na manhã. O orvalho ainda secava por entre as folhas, o farfalhar úmido das árvores em contraste com o calor do início do dia dava uma ansiedade alegre. A jovem sentia que tudo poderia acontecer e ansiava para que acontecesse logo.
De repente escutou um barulho vindo por trás dela, pensou em olhar, porém estava com medo que pudesse ter sido seguida por algum animal caçador. Alguns galhos do chão emitiam que algo pesado os pisava, porém com cautela. Ela apressou o passo procurando alguma árvore que pudesse subir, mas todas eram longas e sem galhos próximos. Ao chegar na margem de um riacho, ela jogou a cesta longe, deixando cair na água, juntou um pedaço de galho grosso e voltou-se finalmente para trás, porém teve uma surpresa. O mesmo homem que conhecera na feira estava a seguindo. Ele sorria candidamente, orgulhoso da peça que pregava.
- Que susto me deste, Miguel! - disse ela.
- Eu queria ver o que você faria se fosse um animal feroz. - disse ele, aproximou-se dela com seu andar calmo. Ela estremeceu, sentia um frio na barriga e seu coração disparava só de olhar para ele, o jeito como andava, como falava e, principalmente, como a olhava - Amo a sua coragem, Sophie!
- Eu poderia ter te machucado - disse ela, fingindo-se de brava, mas o rosto ardido em fogo e o sorrido no canto dos lábios a denunciavam.
- Então deixe-me ajudá-la a buscar o que procura. - disse ele.
A garota lembrou da cesta, porém não a encontrava mais. Fora levada pela água.
- A dona Adele não está bem do estômago novamente. Já avisei que comer tantos ovos de galinha por dia podem lhe fazer mal, mas ela insiste. Vim buscar algo que pudesse aliviar o mal estar, mas agora perdi tudo - disse ela, decepcionada.
- Sinto muito - disse ele, aproximando-se dela ainda mais e recolhendo uma mecha de cabelo ruivo da frente dos olhos dela - mas podemos recomeçar, a manhã ainda está no início.
Ela concordou com um aceno de cabeça e ambos caminhavam lado a lado em silêncio. Em alguns momentos, suas mãos se encostaram. O coração de Sophia estava aos pulos, tinha medo de explodir com o turbilhão de emoções que sentia nos momentos que olhava para Miguel. Ele tinha um olhar profundo, suas mãos eram fortes e seu andar era único, podia reconhecê-lo de longe. A voz era grossa, porém suave, podia convencer qualquer pessoa a fazer o que ele quisesse, se usasse palavras eloquentes. Ao mesmo tempo que tudo nele tirava a sua paz, não queria ir embora. Desejava que cada segundo virasse horas e cada hora virasse dias, para poder ter ele sempre por perto.
- Sophie… - disse ele, de repente, parando pelo caminho - nos conhecemos há algum tempo. Somos amigos… - respirou fundo, ela percebeu seu nervosismo - mas eu quero que saiba que meus sentimentos por você são maiores que uma amizade.
- O que quer dizer? - indagou, tremendo nas pernas, sentia que poderia cair a qualquer momento.
- Quero dizer que… eu te amo. - disse ele, olhando nos olhos da jovem tão profundamente que ela sentia que ele podia atravessá-la.
Sophie sentiu o chão se movimentar. Voltou-se para o horizonte, incerta do que fazer. Muitos pensamentos, medos e anseios percorreram pelo seu corpo. O amor causava essa sensação de perder o chão? Ela teria coragem de pular nesse abismo incerto? Arthur sentiu que ela iria fugir, então a puxou para junto para si e a beijou na boca com toda a ternura que sentia em seu coração. Ela podia sentir a verdade intensa através do seu beijo e do seu abraço. Entregou-se, respondendo ao carinho.
Miriam Coelho |
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