CONTRAPONTO

 

A criança sabe o caminho

Há alguns anos atrás eu estava fazendo um curso de Literatura Infanto Juvenil - maravilhoso, diga-se de passagem - quando me deparei com uma aula sobre a literatura infantil “tabu”. O professor iniciou a fala perguntando para cada um de nós o que é ser criança na nossa opinião. Cada um na sala disse coisas como “brincar”, “sonhar”, “inocência”, etc. Após escutar todos nós, ele passou slides no projetor com imagens de crianças passando fome, sofrendo, lidando com a pobreza e por aí vai. No fim, perguntou “esses também não são crianças?”. Esse início foi para lembrar da importância das histórias que falam em morte, tristeza, abandono e perdas para crianças, pois é a forma de elas entenderem quando isso acontecer com elas também. O mundo não é mágico e brilhante na infância, mudando o tom assim que fazemos uma idade X e somos chamados de adultos. O mundo real também influencia na infância com todo o seu peso e sem reservas.

Com tudo isso, uma das reflexões a que cheguei foi que crianças também lidam com todas as dores que nós adultos lidamos (afinal, eu também lidei com sombras na minha infância), a diferença é que elas ainda conseguem sorrir, brincar e ver graça em coisas que já não vemos mais. Logo, as crianças têm mais resiliência que nós.

Com o passar dos anos, vamos crescendo e cobrindo nossas crianças interiores com os medos não trabalhados, dores não curadas e todas as cobranças do mundo externo sobre quem devemos ou não ser. E lá permanece a nossa parte inicial, no fundo da terra, bem coberta e calada, imóvel porque não pode mais fazer barulho para incomodar os outros. Se tentar se mover, nós jogaremos mais terra, para ela entender que deve permanecer se sacrificando na desculpa de que é para o bem do mundo, quando, na verdade, é para a nossa preguiça, nossa covardia, nosso comodismo, nossa ignorância e nossa raiva de se “não era possível antes, então não será agora!”.

Mas e se você criar coragem e cavar o buraco até encontrá-la? E se ela sair depois da escavação e vocês derem de cara uma com a outra? O que você sentirá ao olhar nos olhos da sua criança? Tive a oportunidade de fazer isso numa prática de Constelação Sistêmica. Nesse dia, fizemos duplas e revezamos a libertação da criança interior de nossas parcerias. Antes de chegar a minha vez, estava aflita. Estou na jornada de crescimento e cura desde os meus 21 anos, mas são tantas coisas que ainda preciso solucionar, que senti medo do que seria de mim ao encontrar a mim mesma com poucos anos de vida.

Porém, para a minha surpresa, quando a pessoa assimilou a informação do meu campo quântico, a menina que surgiu era a lembrança do meu maior tesouro, uma criança cheia de energia, amorosidade, sapeca, rebelde e com todo o potencial artístico do mundo. Eu chorei de emoção e disse em voz alta, as palavras “eu te amo!”. Eu nunca disse isso com tanto sentimento e tanta verdade a ninguém, exceto para essa parte mais linda de mim mesma. Toda essa experiência me fez ver que todos nós guardamos tesouros incríveis dentro de nós. Relíquias empoeiradas, amordaçadas, silenciadas, mal interpretadas, mas jamais deixarão de ser a mais importante preciosidade que possuímos. Quando a libertamos e damos a ela o que pede, temos a chance de entender um pouco mais sobre quem somos, qual o nosso lugar no mundo e qual a nossa maior força diante de todos os conflitos que o mundo nos fornece. As provas nunca acabam, assim como a nossa fonte de energia verdadeira também é infinita. Basta libertá-la.


Miriam Coelho

Miriam Coelho é artista das imagens e das palavras.

CINCO ANOS DE COLETIVEARTS,
CONTANDO HISTÓRIAS, 
CRIANDO MUNDOS!



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